Aparte
OPINIÃO - Bolsonaro, as velhas práticas políticas e o aval a temer

[*] Antonio Carlos Valadares

Até agora só desculpas apontando culpados - O presidente Bolsonaro teima em demonstrar a sua face ranzinza de preferir o confronto ao diálogo no trato com o Congresso.

Em cinco meses de governo, nenhuma novidade, a não ser o tempestuoso decreto das armas, assim mesmo refeito pela ocorrência de inconstitucionalidades flagrantes, o que prova uma falta de cuidado ao legislar sobre temas polêmicos. 

Ao invés de radicalizar como vem fazendo a cada dia, deveria descer do palanque e usar o diálogo como arma, e a articulação política para se impor perante o Congresso.

Não conseguindo transpor a barreira do desemprego que voltou a subir no seu governo, sem um plano definido para tirar o Brasil da recessão, Bolsonaro escolhe como tática de fuga o confronto das ruas e das redes sociais na tentativa de colocar toda a culpa de sua inapetência para governar no colo do Congresso Nacional.

Procurando aparecer como um Messias, ou como um Salvador da Pátria, com o poder subindo-lhe à cabeça e achando que pode resolver tudo sozinho, a olhos vistos despreza o Congresso e insinua que os seus projetos são barrados, ou sofrem obstáculos em sua tramitação, porque se recusa atender às velhas práticas políticas.

Seria uma ameaça às regras constitucionais? Mas afinal, o que quer dizer o presidente com a expressão velhas práticas políticas e quais as consequências se a sua latente indisposição com o Congresso continuar?

Bolsonaro passou 28 anos na Câmara dos Deputados. Mesmo com uma atuação apagada, fazendo parte do chamado baixo clero, não é possível que não tenha aprendido a prática salutar e construtiva da convivência política.

Está na cara que o presidente cria um discurso de ódio contra os políticos ao espalhar aos quatro ventos que, por causa das velhas práticas do meio a que pertenceu não consegue governar como prometera na campanha.

Noto que sua desconsideração ao Poder Legislativo dá claros sinais de que gostaria de governar fora das regras constitucionais, como um dia sonhou Jânio Quadros, que acabou renunciando, pensando em voltar nos braços do povo.

Logo depois sobreveio o golpe de 64, com a derrubada de João Goulart - ainda como efeito colateral do desprezo de Jânio pelo Congresso. 

É essa a tradução e a intenção do comportamento conflituoso do presidente: ao olhar-se no espelho, vê que não é capaz de cumprir as suas promessas de campanha e aponta a carabina de seu twitter para terceiros, na suposição de que vai se livrar da responsabilidade que lhe pesa sobre os ombros.

Repúdio ao troca-troca e o aval a Temer - Entendo que não se deve retornar ao troca-troca. Nisso dou inteira razão ao presidente.

Seria uma desfaçatez proceder como Temer, o qual, para aprovar os seus projetos e arquivar as denúncias contra ele na Câmara dos Deputados, serviu-se do poder da caneta presidencial para fazer nomeações na Esplanada dos Ministérios e nos Estados, apenas atendendo a critérios de ordem política.

É aí onde está o grande equívoco do discurso populista do presidente Bolsonaro. É sabido que nos Estados Bolsonaro deixou nos cargos federais todos os indicados pelo esquema de seu antecessor, o presidente Temer. 

Ou seja, o discurso do presidente perde todo o sentido, sua coerência e cai no ridículo, quando insiste em manter nos Estados a turma do Temer nos cargos federais e, por incrível que pareça, mandando recados às lideranças partidárias que não muda porque combate as velhas práticas

É uma demonstração mais do que evidente do divórcio de Bolsonaro com a realidade política nos Estados, ao avalizar, querendo ou não, com a omissão de sua caneta, o troca-troca do Congresso no Governo Temer, fato que gerou grande parte da insatisfação popular que o conduziu ao governo. 

[*] É ex-senador e ex-governador de Sergipe.

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