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Flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal é premiar prefeito gastador

Espera-se o posicionamento do presidente Michel Temer (Foto: Veja)

É claro que o município brasileiro é o ente da federação mais aviltado pela distribuição de recursos que o país recolhe. Cabe a ele apenas 12% desta fatia, ficando - se este colunista não se equivoca - 22% para os Estados e 66% para a União.

Todos os brasileiros estão cansados, também, de ouvir dizer que Estados e União “não existem”, que “são meras abstrações”. Que o que existe mesmo e de fato são os municípios. É neles onde as coisas acontecem. É neles onde as pessoas reais, de carne, osso e carências, vivem. Portanto, eles merecem mais. Um mais que deve vir de uma reforma fiscal sensata, honesta e decente.

Mas, apesar disso tudo, os municípios brasileiros não merecem a flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF -, como a Câmara Federal fez com aprovação de projeto de lei na última quarta-feira, 5.

A LRF é uma escora, um anteparo, uma proteção para que, mesmo acossados, os prefeitos não façam besteira. A LRF impõe limites de gastos. Há uma infinidade de prefeitos sensatos, honestos, que se matam para manter seus municípios dentro dos limites prefixados pela LRF. Há outros, que não.

De modo que a decisão da Câmara premia esses “outros que não”. A flexibilização dos rigores da LRF premia, sim, os gestores perdulários. E essa concessão é abominável. O que se espera é que Michel Temer não a sancione. Para entender mais sobre isso, leia a seguir texto do jornal Folha de S. Paulo sobre a decisão.

“Em medida que abre espaço para a irresponsabilidade fiscal de prefeitos, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que pode livrar da punição municípios que passem do limite com gastos de pessoal. O texto, que foi votado nesta quarta-feira (5), segue para sanção presidencial. 

O projeto altera a Lei de Responsabilidade Fiscal para acrescentar que os municípios que tiverem queda de arrecadação de mais de 10% não podem sofrer sanções caso ultrapassem o limite de gastos de 60% da receita com servidores ativos e inativos. 

A nova regra só vale se essa redução for causada por queda de repasses do Fundo de Participação dos Municípios ou royalties e participações especiais. Ou seja, por fatores alheios à qualidade da administração do município.

Hoje, caso ultrapasse o teto e não o restabeleça em até oito meses, a cidade fica impedida de receber transferências voluntárias, obter garantia e contratar operações de crédito até regularizar a situação. Ficam proibidos ainda de reajustarem salários de servidores e de realizarem novas contratações.  Votaram a favor da proposta 300 deputados, sendo apenas 46 contrários. 

“Esse é o maior atentado já visto à responsabilidade fiscal neste país”, afirmou a economista Ana Carla Abrão, ex-secretária da Fazenda de Goiás e sócia da consultoria Oliver Wyman. “Significa que não aprendemos nada nos últimos quatro anos de colapso”.

Segundo ela, na prática boa parte dos municípios já não cumprem o limite dos 60%. “O que estamos fazendo é abrindo mais um buraco na LRF, já tão desrespeitada ao longo dos seus 18 anos de vigência”.

O economista Raul Velloso, especializado em contas públicas, avalia que se for sancionado pelo presidente da República, Michel Temer, o projeto pode efetivamente estimular a irresponsabilidade fiscal dos prefeitos.

Ele pondera, entretanto, que em um cenário de queda da arrecadação de impostos por causa da crise econômica recente, a regra da LRF é inexequível, até porque o grande problema dos gastos com pessoal é com os servidores aposentados, e não com os ativos.

“Quando a receita desaba, por conta da maior recessão da nossa história, a razão entre pessoal e receita vai subir e ultrapassar os limites. Esse tipo de regra foi feita para épocas de paz, de normalidade. Não há nada que os municípios possam fazer hoje para resolver a recessão brasileira ou o peso das aposentadorias.”

Segundo cálculo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), mais de 80% dos municípios brasileiros têm situação fiscal considerada crítica ou difícil. 

Ao comentar a aprovação do projeto, o deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) afirmou que o controle dos gastos com pessoal é o núcleo central da LRF. 

“Quando se abre uma exceção para que variações de receitas para se flexibilizar as punições nós estamos abrindo aqui uma porteira para qualquer desculpa de impacto de receita dos municípios seja flexibilizado as sanções”, disse. 

Foi a mesma posição do deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA). “Essa lei é uma lei dura, mas é uma lei que conseguiu enquadrar os municípios para não levar para uma quebradeira geral. Se continuarmos fazendo esse tipo de alteração, de flexibilização, nós podemos estar condenando os municípios em não conseguirem pagar suas contas no fim do mês”, criticou. 

Já o deputado Bebeto (PSB-BA) defendeu a proposta. “Inverdades estão sendo difundidas, ele não objetiva flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal. O centro do projeto é que quando haja por parte do governo federal por exemplo uma desoneração exagerada da folha de pagamento com impacto em estados e municípios na formação do FPM ou que haja crise que assole aquele município que efetivamente os prefeitos não sejam penalizados”, disse”.

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