Aparte
Cassar Título de Cidadania a Haddad é deselegância que não serve a ninguém

Lúcio Flávio Rocha e Fábio Meireles: brincando de dourar o ódio político

Que os novos tempos no Brasil são de ódio político, isso não é nenhuma novidade. Nunca foi tão ofensivo, para quem é de direita, ser de esquerda neste país. Nunca foi tão ofensivo, para quem é de esquerda, ser de direita neste país.

Não é que ser que de direita e de esquerda sejam coisas novas no Brasil e em Sergipe. Não. Sempre existiram figuras políticas e gente do povo pertencentes a esses dois matizes do pensamento político. E é bom quem os haja.

E, mesmo na ditadura militar, que foi tenebrosa, havia um respeito maior do que hoje - pelo menos depois do ciclo do AI-5, o famigerado Ato Institucional de número 5, de 13 de dezembro de 1968, que fechara Congresso, mandara matar e conspurcar qualquer tipo de liberdade.

Mas depois dos terríveis e injustificados desacertos do PT e da vingança posta em prática pelo capitão Jair Bolsonaro e seus seguidores, houve uma abusiva banalização dos conceitos de direita e de esquerda - e contra este último, um ranço em desfavor de algo que já é até morto e sepultado, como o comunismo.

No rastro dessa confusão, vem ações de ódio como emparedar em restaurantes e em espaços públicos gente de alta significação cultural nacional, como Chico Buarque, apenas por ser amigo do preso Lula, numa manifestação ímpar e eunuca de intolerância política.

E esse indecoroso tribunal de rua, que faz pessoas insultarem umas às outras nas praças públicas em que se tornaram as mídias sociais, vaza e contamina até a ação legislativa propriamente dita.  

Na tarde desta quarta-feira, o vereador de Aracaju Fábio Meireles protagonizou uma ação desse naipe: depois de a Câmara da Capital ter aprovado um Título de Cidadania sugerido pelo vereador Camilo Feitosa, PT, para o ex-candidato à Presidência da República pelo PT Fernando Haddad, Meireles entrou com um projeto pedindo a revogação da honraria. Isso mesmo.

“Não vislumbramos nada que o Sr Fenando Haddad tenha feito em prol da nossa cidade, em favor do povo de Aracaju”, argumenta Fábio Meireles em sua justificativa, calçada por uma série de denúncia de supostos atos de improbidade de Haddad e as respectivas denúncias contra ele pela Operação Lava Jata.

A tentativa de anular o Título de Cidadania a Haddad foi comunicada com festa nesta quarta-feira por Meireles e uma nova figura da direita de Sergipe, o jovem empresário Lúcio Flávio Rocha, coordenador do Movimento Brasil200 neste Estado.

“Acabamos de protocolar na Câmara Municipal de Aracaju, através do vereador Fábio Meireles, o pedido de revogação do Título de Cidadão aracajuano do Sr. Fernando Hadad. A nossa justificativa é que esta homenagem só cabe a pessoas não nascidas na cidade que vivem ou já residiram por aqui, que tenham feito algo em benefício coletivo, sem visar ganho pessoal individual. Nenhum destes requisitos é cumprido pelo referido nome”, escreveu Lúcio Flávio, que é um rapaz inteligente, simpático e formado em Comunicação Social com Habilitação em Publicidade & Propaganda e pós-graduado em Marketing.

“Além disto, em época de valorização da Lava Jato, homenagearmos uma pessoa que já foi citada nesta operação, e é réu em tantos processos na justiça, não traria a Aracaju uma boa imagem junto ao resto do país. O vergonhoso e afrontoso título foi proposto pelo vereador suplente Camilo Feitosa, PT, filho do deputado João Daniel, foi aprovado às pressas pela Mesa Diretora”, completou a comunicação dele.

Ora, essa ação é odienta. É um coquetel de puro ódio. De pura mistificação e afetação política, que desserve a Aracaju, desserve a Sergipe e que desserve ao Brasil. Numa nação de 20 milhões de desempregados num conjunto de 110 milhões de trabalhadores economicamente ativos, exige-se é a revogação de outras coisas, como esse ódio e essa segregação que apartam irmãos, e não de um título de cidadania.

Não fosse o ódio do vereador Fábio Meireles, que gera essa apartação total, ele poderia ao menos prestar a atenção na manifestação de acolhida que os aracajuanos fizeram a Haddad no segundo turno da eleição do ano passado, ao darem-lhe 15.989 votos a mais do que a Jair Bolsonaro - 155.892 votos contra 139,903. Ou talvez mirasse nos 394.201 votos de frente que ele obteve sobre Bolsonaro no Estado - 759.061 contra 364.860.

Mas, um pouquinho mais de análise, de tolerância política e humana, talvez consolasse e amainasse o vereador aracajuano se ele sopesasse que Bolsonaro tacou mais de 10 milhões à frente de Haddad no campo nacional - foram 57.797.847 contra 47.040.906. Estava claro, e com lógica profunda: o Brasil não queria ali mais o PT, não queria Haddad. 

Aplicando-se esses números à lei da guerra, há de convir que Fernando Haddad é um morto de guerra. Da guerra política. E pelos próprios códigos dessa lei, é crime ofender e chutar feridos e vencidos. Mas talvez os novos tempos de ódio político do Brasil não facultem ao nobre Fábio Meireles vislumbrar o tamanho da sua deselegância. Ou da sua agressão. O certo é que essas deselegância e agressão não servem a ninguém.

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