Aparte
OPINIÃO - A monogamia é uma invenção cultural

[*] Adalberto Vasconcelos Andrade

Para o zoólogo americano David Barash, “a monogamia é rara entre mamíferos; é quase inédita entre primatas. Antes do colonialismo ocidental e do imperialismo social judaico-cristão, a vasta maioria das sociedades humanas era poligâmica”. O amor romântico simplesmente não existia antes do século XII. 

Durante a Idade Média, casava-se por todas as razões possíveis, mas nunca por amor. Quem juntou casamento com amor foi a Igreja. O casamento monogâmico foi instituído como sacramento pela Igreja no final do século XIII, mas somente em fins do século XIX foi que a Igreja uniu amor e casamento na monogamia. A desgraça estava feita. 

Vivemos numa sociedade monogâmica e a sexualidade é poligâmica, por isso a sexualidade da espécie humana não se sustenta bem. Casamento é uma coisa; sexo, outra. Os seres humanos são polígamos por natureza - porém a ciência insiste em provar que o ímpeto sexual dos machos é maior ou mais difícil de controlar do que o das fêmeas. 

Mas a sexualidade humana não se restringe apenas ao aspecto biológico. As diferenças no comportamento sexual entre homens e mulheres creio que têm mais a ver com a época, o lugar e a cultura do que com os hormônios presentes na corrente sanguínea.

Os homens ao longo da história sempre gozaram de privilégios a tudo que diz respeito à sexualidade e o seu direito ao prazer. Ainda hoje, o impulso ou desejo de praticar a atividade sexual é tão forte que muitos confundem cordialidade feminina com interesse sexual. 

Outros ao virem mulheres vestidas de maneira sensual acreditam que estejam a fim de sexo, e por pensar assim alguns se excedem na abordagem. Não percebem que na maioria das vezes elas estão apenas sendo gentis ou se vestindo de acordo com seu estado de espírito.

Mas as mulheres não devem se irritar por causa disso. Elas continuam donas da situação. Afinal de contas, a decisão de se deixar envolver por um homem comprometido, casado ou mulherengo é exclusivamente delas. Se no primeiro encontro isto ainda é um mistério, no segundo saberá muito mais a seu respeito e quais são suas reais intenções. Por mais que sejam cortejadas e desejadas, são elas que irão decidir se haverá sexo ou não. Ou até mesmo um terceiro encontro.

Os machos sempre querem mais. As fêmeas, também. A diferença é que há séculos os homens têm sido beneficiados pela ciência, pela tradição e pela cultura – endossadas por fatores biológicos e por conceitos machistas que os próprios adotaram como verdadeiros. Por isso, continuam traindo sem qualquer sentimento de culpa, remorso ou arrependimento. 

É como se fosse um direito adquirido. Se a ciência diz que é instinto do macho querer mais de uma fêmea, temos que conside¬rar que atualmente a mulher exerce a sua sexualidade com a mesma desenvoltura e com o mesmo apetite sexual do sexo masculino.

No mundo animal, as fêmeas não re¬primem seus instintos naturais. As mulheres sim, por uma questão cultural. Os seres humanos são infiéis por natureza, embora as mulheres sejam mais discretas, porém extremamente vingativas. Em “Culpada” – composição de Claudia Brant e Gabriel Flores – que fez sucesso na voz de Wanessa Camargo, têm algumas passagens que traduzem o sentimento de quem já foi traída: “Os homens não são os únicos / Com amores escondidos / É que as mulheres disfarçam bem melhor / O proibido / Eu também te traí / Eu também te enganei / O sabor do pecado / Eu também já provei / Fui pior que você / Porque eu soube esconder / Então já não se culpe meu bem / Eu sou culpada também”.

Com a certeza de que foram enganadas, muitas recorrem à pena de Talião: olho por olho, dente por dente. Por isso, há quem diga que mulher não trai. Mulher se vinga. Aqui é oportuno destacar que atualmente as mulheres já estão adotando posturas que antes eram típicas do sexo masculino. 

O amor pode até ser uma invenção cultural - assim como a própria monogamia entre muitas sociedades –, mas o ser humano é formado por um feixe de elementos culturais e isso não pode ser desprezado. A ciência diz que as baratas são monogâmicas, mas nós não somos baratas. Ou gansos, que escolhem um parceiro para o resto da vida. Sendo assim, que atire a primeira pedra quem nunca pecou. Ou melhor, quem nunca traiu ou foi traído.

 [*] É administrador de empresas, policial rodoviário federal aposentado e escritor. Este texto e mais um outro da mesma linha de afetividade humana e da autoria dele serão publicados nesta Coluna Aparte como forma de homenagem ao Mês dos Namorados.
 

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