Aparte
Opinião - Os golpistas já mostram as caras

[*] Ivan Valença

Continuo achando que, além dos aviões da carreira (1), há no ar um cheiro muito forte de golpe de Estado. Na noite de 31 de março de 1964, o Exército enxotou da Presidência da República o estancieiro gaúcho João (Jango) Goulart e assumiu o que ambicionava desde 1952 (2). Jango já havia fugido para sua terra natal, o Rio Grande do Sul, e poucas horas depois pediu asilo no Uruguai.

Assim, o povo brasileiro acordou-se em 1º de abril sob as ordens de um triunvirato militar até que se preparasse a eleição do marechal Castelo Branco. Os chamados “chefes civis” da “Revolução” sequer foram cogitados para absolutamente nada - tiveram que engolir a seco o golpe dos militares. Foi um golpe essencialmente militar e que perdurou por algum tempo, pouco mais de 20 anos.

O que está no ar agora é um golpe essencialmente político contra um governo legítimo, eleito pelo povo com mais de 50 milhões de votos. Já se fala abertamente nisso. O presidente do DEM, o prefeito de Salvador, ACM Neto, publicou um texto em que praticamente desautoriza o golpe a ser perpetrado sob a liderança do presidente da Câmara dos Deputados, Sr. Rodrigo Maia, em conluio com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre e do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, recém-demitido pelo presidente Jair Messias Bolsonaro por divergências de opiniões com o chefe da nação. Mandetta esqueceu-se de uma lição antiga: não se diverge de quem tem a caneta na mão.

Político carioca, Rodrigo Maia é filho de um outro carioca das antigas, César Maia, o ex-prefeito do Rio de Janeiro e veterano militante do Partido Comunista. Rodrigo Maia já não consegue esconder de ninguém que a coisa que mais ambiciona na vida é ser presidente da República do Brasil.

O candidato nas eleições de 2018 deveria ter sido ele, Rodrigo Maia, mas até seus próprios correligionários tinham dúvida do seu potencial eleitoral e preferiram apoiar um veteraníssimo parlamentar, Jair Messias Bolsonaro, que não encontrou dificuldades para derrotar um outro “poste” de Lula, Fernando Haddad, designado pelo próprio Lula como candidato do PT.

Desde o primeiro dia do mandato de Bolsonaro que Rodrigo Maia não faz outra coisa na vida senão conspirar para derrotar o presidente da República. Talvez por já saber que não dispõe de todo um cacife para ir às urnas (ademais, as próximas eleições presidenciais ainda estão muito longe), ele abraçou a causa do parlamentarismo.

Pelo menos até agora, essa é uma causa que não repercutiu no país, a ponto de credenciá-lo como porta-voz da troca de regime. No passado, quando de uma crise política, o presidencialismo foi trocado pelo parlamentarismo, mas na primeira oportunidade a opinião pública sepultou o regime, fazendo ouvidos de mercador aos políticos que defendiam o regime de primeiro-ministro.

No Brasil, o parlamentarismo teve que enfrentar uma crise por semana, um desgaste que a opinião pública julgava desnecessário, até que foi jogado para escanteio. E voltamos ao surrado presidencialismo. Mas, a ambição de Rodrigo Maia para chegar à chefia do governo é tamanha que, há poucos meses ele pegou um avião e foi à Espanha sem que ninguém soubesse o seu destino e o que ia fazer lá.

Ele ainda estava em Madri, quando vieram algumas respostas: ele foi lá tomar informações sobre o regime vigente lá, o Parlamentarismo, e como os golpistas já dão as caras (sic) introduzi-lo aqui. Ele tentou desmentir esta última parte, mas os espanhóis confirmaram que foi isso mesmo que ele foi fazer por lá. Desembarcou por aqui poucos dias depois, mas se negou a fazer um balanço da viagem.

Ultimamente, a vida parlamentar de Rodrigo Maia é criticar o governo de Bolsonaro. Ou atrapalhar o seu governo. Ele logrou a aprovação na Câmara de um projeto que é um escândalo: o governo abriria o cofre para entregar aos políticos que ele indicar nada menos que R$ 200 bilhões para ir às eleições municipais próximas, de outubro deste ano.

O próprio presidente Bolsonaro achou a quantia muito alta para gastar assim desse jeito - e sem exigir sequer uma prestação de contas que passasse pelo crivo do Tribunal de Contas da União. Mas Rodrigo Maia não abriu mão: seriam R$ 200 bilhões ou nada. O projeto foi aprovado na Câmara, mas empacou no Senado. Pode ser que passe no Senado, mas a opinião pública não vai esquecer essa maracutaia. 

Rodrigo Maia está virando o sujeito que os brasileiros adoram chacotear. Se conseguir realmente os R$ 200 bilhões pretendidos ele deixará de ser o bobo da corte e se tornará o homem que peitou Bolsonaro e lhe arrancou essa dinheirama toda sem precisar prestar contas… Quer coisa mais maravilhosa?

Dentro do seu próprio partido, o DEM, ele não encontra unanimidade. O presidente do DEM, o “baixinho” prefeito de Salvador, ACM Neto, fez um artigo desautorizando o “trio maravilhoso” do partido a continuar articulações por um golpe de Estado que, mais uma vez, eliminaria o presidencialismo para introdução do parlamentarismo.

E nominou-os um a um: Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e Luiz Henrique Mandetta. Ele diz que eles esticaram a corda e que não se coloca contra a parede um integrante do TTC (3). Acha que Rodrigo Maia precisava primeiro cumprir a palavra de acabar com as mordomias na Câmara dos Deputados que ele tanto anunciou e não fez até hoje. Os três seriam vestais da moralidade.

Gostaria de dedicar este artigo aos fedelhos do PT que usam cueiros políticos, mas se julgam gênios que podem desafiar todo mundo. Agora podem me esculhambar à vontade, canalhas e mentecaptos de hoje. (1) - Frase muito usada entre 1963 e 1964;

(2) - A tentativa de golpe contra o então presidente Getúlio Vargas foi realmente muito violenta, levando às prisões das unidades militares federais muita gente que torcia contra, inclusive aqui no Estado de Sergipe e (3) Jargão militar que significa Tropas, Tanques e Canhões.

[*] É jornalista da velha guarda sergipana e escreve semanalmente no Portal Infonet. A propósito do “Os golpistas já mostram as caras”, publicado no último domingo, 19, a Infonet acostou a seguinte nota pé: “O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet”. É algo óbvio demais para merecer a justificativa.