MINHA CASA, MINHA VIDA
Por TJ-SE | 03 de Nov de 2017, 11h51
Juíza esclarece reintegração de posse em Malhador
NOTA DE ESCLARECIMENTO
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Juíza esclarece reintegração de posse em Malhador

Cidade de Malhador, Estado de Sergipe

O Juízo de Direito da Comarca de Malhador, no Estado de Sergipe, vem, por meio desta, proceder a informações a respeito do cumprimento de mandado de reintegração de posse deferido por este órgão jurisdicional em 14 de junho de 2017, o que faz imbuído do propósito de fornecer à população em geral um panorama o mais completo possível de todos os fatos que cercam o caso, presentes sensíveis interesses coletivos que importam a toda a comunidade.

Foi ajuizada, em 26 de maio de 2017, ação de reintegração de posse pelo Município de Malhador, alegando que pessoas haviam invadido casas ainda em construção, concernentes à implementação de programa habitacional denominado Minha Casa, Minha Vida, de titularidade do Governo Federal e executado pela Prefeitura Municipal desta cidade.

A alegação fática da municipalidade é de que, antes da conclusão da obra e da entrega das unidades residenciais ao pessoal cadastrado como beneficiário do programa, indivíduos ingressaram nas casas ao arrepio do cronograma e da organização cadastral elaborada pela administração municipal, alguns até (embora em pequeno número) integrantes da lista de utentes do programa.

Este juízo, ouvido o órgão do Ministério Público, que se posicionou pela concessão da medida em caráter liminar, houve por bem deferi-la em 14 de junho de 2017, decisão essa que foi desafiada por agravo de instrumento interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe – processo 2017.008.20110 / Rel. Des. Alberto Romeu Gouveia Leite, recebido sem efeito suspensivo (mantida portanto a decisão deste juízo) em 17 de agosto de 2017, e que mereceu, da Procuradoria-Geral de Justiça, pelo Procurador de Justiça Jorge Murilo Seixas de Santana, parecer pela preservação da decisão deste juízo.

Em 31 de agosto de 2017, a Defensoria Pública do Estado de Sergipe, por intervenção do seu Núcleo de Direitos Humanos, requereu a admissão na demanda e a designação de audiência de concilição como ato prévio ao cumprimento da liminar deste juízo; em decisão de 25 de setembro, foi admitida a participação do aludido órgão no feito, porém foi denegada, motivadamente, a designação de audiência de conciliação como condicionante à obediência à ordem judicial, proferida há quase 3 meses; dessa decisão, não foi interposto qualquer recurso.

Até então não cumprida a liminar, este juízo fora informado de que as forças policiais do Estado de Sergipe (já instadas mercê do art. 536, § 1.º do Código de Processo Civil) haviam concedido aos invasores o prazo fatal de desocupação espontânea dos imóveis até o dia 11 de setembro de 2017 (quase 90 dias após a concessão da liminar), lapso que, entretanto, não foi obedecido.

Ainda diante da aberta desobediência à ordem judicial, este juízo instou o Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado da Segurança Pública e o Excelentíssimo Senhor Comandante–Geral da Polícia Militar, facultando-lhes o prazo de mais 30 (trinta) dias para o cumprimento da requisição, em meio ao qual recebeu expediente de órgão subalterno do Comando-Geral da Polícia Militar do Estado de Sergipe, no sentido de que o cumprimento à decisão judicial apenas poderia ser implementado se este juízo participasse ativamente da medida, promovendo expedientes a órgãos públicos e privados, com o propósito de darem apoio logístico à execução da diligência.

Entendendo o juízo que tais medidas não lhe competem, já que concernem à execução da decisão (a cargo da Administração Pública, de quem foi requisitado o auxílio), foi então encaminhado ofício à Egrégia Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, dando-lhe ciência dos acontecimentos, a fim de avaliar medidas cabíveis a seu cargo para que a decisão judicial seja cumprida em sua efetividade, tudo tendo sido também objeto de despacho fundamentado deste juízo contido nos autos do processo em referência, e do qual não houve qualquer recurso.

Não o fez, contudo, antes de receber comunicado oficial de três das invasoras que compareceram a juízo informando que pretendiam cumprir a liminar, mas que estavam impedidas pela liderança do movimento de fazê-lo; e de receber petição da municipalidade autora de que havia balbúrdia na localidade, e que estava a ocorrer depredação das unidades residenciais, assim como obstrução ao direito de ir e vir de pessoas que já se haviam determinado a cumprir a decisão judicial.

Em meio a tais ocorrências, este juízo sente-se surpreendido com notícias divulgadas em páginas eletrônicas e órgãos de imprensa, em que membro de destacada instituição, cuja identificação fica preservada por um preito à elegância e ao respeito, imputa à titular do juízo, até mesmo lhe transcrevendo o nome, uma antecipação do cumprimento da decisão e um lamento por se ter omitido em intimar órgãos indispensáveis à execução.

Sobressalto maior não poderia sobejar na constatação de que tais declarações teriam advindo operador jurídico que estava ciente de todos os trâmites processuais e todas as decisões deste juízo desde o ingresso no feito, em 31 de agosto de 2017, contra as quais não ofereceu qualquer refutação recursal.

Pranteia-se saber que ele inclusive fora notificado pessoalmente da decisão em que este juízo entendeu que não lhe competia, e sim às forças policiais requisitadas, concitar órgãos a dar apoio logístico para o exato cumprimento da liminar; e a manifestação que lhe adveio foi “venho por meio deste manifestar ciência acerca do parecer do Ministério Público”.

O fato é que este juízo entende, firmemente, que, na repartição das atribuições constitucionais inerentes aos poderes da república, não impende ao Poder Judiciário disparar ofícios a quem quer que seja para dar apoio para atender a decisão judicial ... Cumpre-lhe, tão apenas, requisitar força policial, aos auspícios da qual competem ser implementadas medidas que intentem lhe dar o efetivo cumprimento, segundo seus órgãos de execução.

Este juízo, a despeito disso, em momento algum se omitiu em intimar órgãos; ao reverso, mostrou que tal tarefa, embora salutar ao cumprimento do julgado, não lhe pesaria, pois não é missão do Estado-juiz, mas sim de quem estava encarregado de cumprir a decisão, no caso, o Poder Executivo do Estado de Sergipe, cujas forças policiais foram requisitadas; e o fez por despacho motivado e que não foi objeto de recurso.

Honra, aliás, este juízo, a constatação de que o Superior Tribunal de Justiça também expende semelhante diretriz, quando ressalta que “O juízo de proporcionalidade a ser realizado quanto ao modo de intervenção policial não recai no Judiciário, mas na hierarquia da Corporação, em cujo topo se encontram o Governador do Estado e, subordinado a ele, o Comandante-Geral. Tanto assim que estes agentes públicos e a cadeia de comando que deles se origina – e não o magistrado – responderão por eventuais excessos, na medida de sua culpabilidade” (STJ, 2.ª Turma, RMS 48.316/MG, Rel. Min. Og Fernandes, j. 17/09/2015)

A ideia-força que move este juízo, e que foi externada em exaustivas decisões judiciais proferidas nos autos do processo em referência (2017.812.00483), é que uma vez requisitada a força policial para dar cumprimento à decisão, todo o planejamento e execução do mandado fica a cargo das autoridades administrativas do Estado de Sergipe, não cabendo mais qualquer intromissão do Estado-juiz para concitar terceiros a auxiliar nas diligências.

Ademais, este juízo não antecipou o cumprimento da decisão; a decisão que determina a reintegração de posse das unidades residenciais é de 14 de junho de 2017, e os invasores tiveram até 11 de setembro de 2017, prazo oferecido pelas próprias forças policiais, para lhe dar efetivo cumprimento.

Mas é importante que se frise que, mesmo assim, o cumprimento não foi antecipado, e nem por este juízo, já que todo o cronograma de cumprimento da decisão judicial está a cargo do Comando-Geral da Polícia Militar do Estado de Sergipe.

Assim, este juízo não interferiu em momento algum nem quanto à data e nem quanto ao modo de seu cumprimento; e não o fez simplesmente porque, como já assinalado, tem a firme convicção de que, já requisitada a força policial, o bastão passou às autoridades administrativas a quem compete atender à requisição.

Este juízo tão somente encaminhou ofício à Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe comunicando os fatos, e que a decisão até então não havia sido cumprida; após fazê-lo, deu andamento prioritário ao feito rumo à resolução final, atendendo a Recomendação 22/2009, do Conselho Nacional de Justiça.

Mas quanto ao cumprimento da medida liminar, todo o ocorrido ficou a cargo das forças policiais em compasso com os oficiais de justiça – executores de mandados, que levaram a bom termo as diligências, que resultaram em absoluto sucesso.

Importa realçar, no que toca à necessidade de cumprimento da liminar, conquanto se admita a vulnerabilidade das pessoas em torno das quais girou o cumprimento da medida, que igual desvelo merecem os interesses das pessoas que se encontram cadastradas no programa, tão hipossuficientes quanto os invasores, mas que, ao contrário deles, esperam de forma ordeira receber suas casas; e ainda merece cura a preservação do direito de ir e vir daqueles invasores que resolveram cumprir a liminar e estavam sendo inibidos.

Por fim, este juízo esclarece que se mantém em alerta, e sempre pautará o exercício de sua atuação jurisdicional dentro dos lindes legais e constitucionais que lhe foram reservados, e que nesse desempenho não tolerará ser utilizado de veículo de interesses inconfessados, seja de cunho partidário ou de midiática promoção pessoal, de quem quer que seja.

Para além disso, tem a mais inexorável convicção do seu esforçado desempenho da jurisdição, da força de suas razões (aliás, não contrariadas na via recursal) e dos valores humanitários que marcam a sua vida pessoal e profissional.

Fora dessas linhas, é empolgar a recalcitrância ao cumprimento de ordem judicial, algo aberrante ao Estado Democrático de Direito, para que, por imposição e inspiração constitucional, as instituições públicas não foram vocacionados.

                                                 Malhador, 1.º de novembro de 2017

                                             Patrícia Cunha Paz Barreto de Carvalho

                                                             Juíza de Direito

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