AGORA É O SISTEMA FINANCEIRO
Por FOLHA DE S.PAULO ONLINE | 04 de Set de 2017, 10h08
Falhas e omissões colocam bancos na mira da Operação Lava Jato
Falhas e omissões de bancos nacionais já foram descritas por alvos da Lava Jato, como o operador Adir Assad e um ex-executivo da empreiteira Odebrecht
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Falhas e omissões colocam bancos na mira da Operação Lava Jato

O empresário Adir Assad, preso no Paraná, que assinou acordo de delação premiada

FELIPE BÄCHTOLD
FLÁVIO FERREIRA
DE SÃO PAULO

 

Depoimentos de investigados na Operação Lava Jato mostraram que os valores milionários resultantes do esquema de corrupção na Petrobras transitaram pelo sistema bancário e colocaram em dúvida os mecanismos de fiscalização da circulação de dinheiro ilícito.

Falhas e omissões de bancos nacionais já foram descritas por alvos da Lava Jato, como o operador Adir Assad e um ex-executivo da empreiteira Odebrecht.

Agora, o assunto se tornou uma das frentes mais recentes da força-tarefa em Curitiba, que apura se houve descumprimento de regras de conformidade dos bancos. O setor também pode virar alvo da delação, em negociação, do ex-ministro petista Antonio Palocci.

O sistema financeiro tem uma série de obrigações para barrar movimentações suspeitas, como as provenientes de desvios em obras públicas e pagamento de propina, investigados na Lava Jato.

O chamado "compliance" (conformidade) estabelece internacionalmente uma série de regras e conceitos como "conheça seu cliente" e a verificação de "pessoas politicamente expostas", como agentes públicos.

A facilidade para operações ilegais no Brasil foi mencionada em depoimentos ao longo da operação.

O caso mais recente foi o do operador Adir Assad, condenado e preso na Lava Jato. Ao depor no Rio, ele falou: "Por causa do relacionamento com os bancos, tínhamos facilidade de pegar dinheiro na boca do caixa." Dono de empresas que ele diz ser de fachada, Assad não deu mais detalhes sobre os supostos benefícios.

Em março deste ano, Luiz Eduardo da Rocha Soares, ex-integrante do chamado departamento de propina da Odebrecht, disse, ao depor no Tribunal Superior Eleitoral, que o compliance brasileiro é "um pouco falho".

Disse que seu receio de ser descoberto era muito maior em relação às atividades mantidas nos EUA porque o mecanismo de controle era "muito maior". "Como é que pode tanto dinheiro circular e o pessoal consegue sacar desses bancos? Está aí a diferença. No exterior, o pessoal não consegue sacar muito dinheiro nos bancos."

Nessa audiência, o ministro da corte Herman Benjamin, relator do processo de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, disse ao ex-executivo que o processo era uma oportunidade de melhorar o sistema.

Tanto Assad quanto Rocha Soares não citaram os bancos que teriam beneficiado as atividades ilegais.

DEBATE EM CPI

No primeiro ano da Lava Jato, um funcionário do Banco do Brasil em São Paulo, Rinaldo Carvalho, foi condenado a dois anos e oito meses de prisão pelo juiz Sergio Moro por corrupção.

Ele tinha sido acusado de receber R$ 4.000 do grupo da doleira Nelma Kodama, primeira presa da Lava Jato, para manter contas de empresas de fachada no banco e não comunicar as movimentações suspeitas ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), ligado à Fazenda. Uma troca de mensagens o mostrou alertando a não fazer depósitos em uma conta bloqueada.

Carvalho trabalhava como assistente de negócios em uma agência na capital paulista. Ele negou acusações e disse que só pediu um empréstimo para a doleira. A sentença foi confirmada em segunda instância e ele foi demitido do banco.

Ligada ao doleiro Alberto Youssef, Nelma e seu grupo eram suspeitos de enviar dinheiro ao exterior por meio de importações fictícias. Na época, os processos eram restritos a operadores financeiros –construtoras e políticos não tinham sido acusados.

Naquele mesmo processo, o delator Luccas Pace, apontado como auxiliar de Nelma, falou em "conivência" e "falta de controle" de bancos sobre movimentações atípicas, ao não se informar sobre a estrutura de empresas.

O presidente do Coaf, Antonio Gustavo Rodrigues, e um diretor do Banco Central negaram conivência das instituições financeiras.

OUTRO LADO

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirma que os dados passados pelo setor bancário estão na origem de investigações importantes do país, "inclusive na abertura da Operação Lava Jato".

Segundo a entidade, foram 56 mil comunicações de operações suspeitas ao Coaf em 2016 e outras 34 mil de janeiro a julho deste ano.

"Os bancos têm investido na capacitação de pessoas, no desenvolvimento de sistemas de inteligência e na atualização de processos para identificar e reportar as operações atípicas –aquelas que indicam irregularidades ou
são incompatíveis com o patrimônio ou ramo de atividade dos clientes", afirmou a Febraban, em nota à reportagem.

Se for constatado algum "desvio de conduta" de um funcionário, diz a federação, as autoridades competentes são comunicadas e sanções são aplicadas internamente.

Procurado, o Banco do Brasil disse que o funcionário que foi detido na Lava Jato foi demitido por justa causa e que a apuração interna sobre o caso foi repassada às autoridades.

O banco também afirmou que adota "controles rigorosos de prevenção e combate à lavagem de dinheiro".

SAIBA MAIS

Em junho, o presidente Michel Temer assinou medida provisória que permite ao Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários fecharem acordos de leniência com instituições financeiras que admitirem práticas ilegais. A leniência é uma espécie de delação de pessoas jurídicas.

A medida também limita em até R$ 2 bilhões as punições do BC para esses casos.

O assunto agora está sendo discutido no Congresso.

O ex-ministro Antonio Palocci, que negocia delação, pode detalhar em seus depoimentos irregularidades envolvendo bancos. 

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