Indígena
Por Terra | 29 de Jul de 2019, 11h46
Randolfe Rodrigues: \"Governo federal incentiva garimpo em terras indígenas\"
Chefe Emyra Waiãpi foi encontrado morto na segunda-feira, 22
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Randolfe Rodrigues: \"Governo federal incentiva garimpo em terras indígenas\"

Território dos waijãpi foi demarcado em 1996 e, em quase 24 anos, nunca houve algo da natureza do que foi denunciado, diz Rodrigues (Foto: ABR / BBC News Brasil)

O senador pelo Amapá Randolfe Rodrigues, Rede, disse em entrevista à BBC News Brasil que o governo de Jair Bolsonaro, PSL, incentiva invasões de terras indígenas para a exploração de minério, como as denunciadas recentemente por lideranças do povo wajãpi, no oeste de seu Estado, e que estão sendo investigadas pela Polícia Federal e pela Fundação Nacional do Índio - Funai. A polícia também investiga se a morte do chefe de uma aldeia na semana passada está ligada às invasões.

Em nota divulgada neste domingo, 28 de julho, o Conselho das Aldeias Wajãpi disse que um grupo de invasores armados entrou na sexta-feira na aldeia Yvytotõ, ocupou uma casa e ameaçou os moradores, que fugiram no dia seguinte do local. No sábado, moradores de outra aldeia, a Karapijuty, teriam avistado um possível invasor nos arredores.

Os dois locais ficam próximos da aldeia Waseity, onde o chefe Emyra Waiãpi foi encontrado morto na segunda-feira. De acordo com a nota do conselho wajãpi, não houve testemunhas, mas parentes examinaram o local e "encontraram rastros e outros sinais de que a morte teria sido causada por pessoas não indígenas".

A Funai não confirmou a invasão até a publicação desta reportagem. O órgão pediu no sábado à PF para ir à região com seus funcionários. A equipe chegou apenas no domingo por se tratar de um local de difícil acesso. Uma vez lá, foi aberto inquérito para apurar a morte do líder wajãpi.

À BBC News Brasil, a assessoria de imprensa do órgão disse que aguarda o relatório da PF para divulgar novas informações. A reportagem não conseguiu contato com a PF neste domingo.

Bolsonaro diz que busca parcerias para exploração mineral

O senador Randolfe Rodrigues diz que o povo wajãpi teve seu território demarcado em 1996 e, em quase 24 anos desde então, nunca havia ocorrido algo da natureza do que foi denunciado.

Ele afirma que um incidente assim indica "claramente que há um incentivo à atividade garimpeira em terras indígenas pelo próprio governo".

"O presidente vem dizendo que existe muita terra para pouco índio e, recentemente, disse que enviaria seu filho para ser embaixador no Estados Unidos para articular a ação de mineradoras em terras indígenas", diz o senador.

Rodrigues faz referências a declarações feitas por Bolsonaro no último sábado no Rio de Janeiro, em cerimônia das Forças Armadas, em que defendeu a exploração de minérios nestas áreas, segundo reportagem do jornal O Globo.

"Estou procurando o 'primeiro mundo' para explorar essas áreas em parceria e agregando valor. Por isso, a minha aproximação com os Estados Unidos. Por isso, quero uma pessoa de confiança minha na embaixada dos Estados Unidos", disse Bolsonaro.

Procurado pela BBC News, o Planalto disse que não comentará as declarações do senador Randolfe Rodrigues nem a investigação da invasão denunciada pelos wajãpi.

Situação é 'grave', diz presidente do Senado

De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, um documento interno da Funai diz que um grupo invasor formado por até 15 pessoas, possivelmente garimpeiros, portando armas de grosso calibre, assumiu o controle de uma aldeia wajãpi e fez incursões para intimidar índios da região, que é rica em ouro. Este mesmo grupo teria sido o responsável pela morte de Emyra Wajãpi.

Mas, segundo o procurador-chefe da Procuradoria da República no Amapá, Rodolfo Lopes, é prematuro afirmar que os assassinos do chefe da aldeia Waseity sejam garimpeiros que invadiram a reserva.

"Há várias linhas investigativas em curso, e não é possível afirmar o que ocorreu. Estamos trabalhando com várias hipóteses. É possível que o crime tenha sido praticado por garimpeiros, por caçadores ou até mesmo por outros indígenas", disse Lopes à Rádio Nacional.

No Twitter, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, DEM, que representa o Amapá na Casa, classificou como "grave o conflito que está ocorrendo entre os índios wajãpi e garimpeiros em Pedra Branca do Amapari".

Alcolumbre disse que, por ser uma região afastada e de difícil acesso e, ao mesmo tempo, rica em minério, "desperta a cobiça de grupos diversos".

"Os esforços devem ser concentrados em garantir a segurança e o direito dos povos indígenas, que sempre viveram nessa região, direito garantido constitucionalmente", escreveu o senador.

Em junho, a BBC News Brasil publicou uma reportagem mostrando que o ouro se tornou em 2019 o segundo produto mais exportado por Roraima, embora o Estado não tenha nenhuma mina operando legalmente.

E, nesta semana, uma nova reportagem mostrou como imagens de satélite revelam uma expansão recente nos focos de garimpo ilegal em terras indígenas da Amazônia desde janeiro deste ano.

Tema foi promessa de campanha do presidente

A exploração de minério e a permissão de que sejam realizadas outras atividades econômicas em terras indígenas é uma promessa de campanha de Bolsonaro.

"O índio norte-americano vive, em grande parte, de royalties de cassinos. Vocês aqui podem viver de royalties não só de minérios, mas da exploração da biodiversidade, bem como royalties de possíveis hidrelétricas que poderiam ser construídas nas terras. O que nós queremos é que os índios usufruam dessas terras, que não podem continuar sendo preservadas para o bem não se sabe de quem. Essa terra tem que ser explorada de forma racional", disse ele em vídeo publicado em sua conta no Twitter em outubro do ano passado.

A Constituição de 1988 prevê a exploração mineral em terras indígenas desde que ela seja regulamentada por leis específicas. Desde 1996, tramita no Congresso um projeto sobre o tema. Mas, como até hoje leis desta natureza não foram aprovadas, a atividade é ilegal.

Mas, segundo O Globo, o governo federal já tem pronta um projeto de lei para mudar essa situação, ao regulamentar a mineração de terras indígenas, segundo o qual os povos poderiam vetar essa atividade e receberiam royalties sobre o que for extraído.

Fonte: Terra

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