Reportagem Especial

Tatianne Santos Melo

Compartilhar

Futuro governador terá que desempenar eixo econômico de Sergipe

Finanças do Estado não vão bem e, colocá-las em ordem será um dos maiores desafios para o novo governador - seja Belivaldo, PSD, que disputa a reeleição, ou Valadares Filho, PSB, candidato da oposição  

Em 2016, apenas 5,4% da receita do Estado de Sergipe foram alocados em investimentos. Na relação do ranking da crise fiscal dos Estados, Sergipe está em 8º lugar: em um dos indicadores, o da relação do gasto com pessoal e a receita corrente liquida, tem 48,6% de comprometimento. Em outro indicador, o da relação da dívida com a receita corrente liquida, o comprometimento é de mais de 60%.

Já a despesa com pessoal, entre ativos e inativos, chegou a 48% da receita corrente liquida em 2016. Aliás, dados do déficit previdenciário mostram que Sergipe teve que aportar, em média, 10% da receita corrente liquida para cobrir despesas com inativos e pensionistas nos últimos anos. 

Tudo isso comprova o que já não é nenhuma novidade: as finanças do Estado não vão bem e, colocá-las nos eixos, sem dúvida, será um dos maiores desafios para o novo governador – seja ele o próprio Belivaldo Chagas, PSD, que disputa a reeleição, ou Valadares Filho, PSB, candidato da oposição. 

Bruno Setton: “A gente vê que não se trata de uma crise proveniente de estoque de divas do passado. É um problema estrutural”
Paulo Pedroza: “Não se vislumbra uma retomada da economia em 2019. Mas há um problema grave, que é a sonegação de impostos”

AJUSTES

Além disso, segundo o secretário, o controle efetivo sobre a folha de pessoal e a correção de distorções também já é uma realidade. “As despesas de custeio como um todo foram e continuam sendo reduzidas, em uma economia superior a R$ 20 milhões por mês”, ressalta.

Ele confirma que os últimos meses mostram tendência de crescimento robusto na arrecadação própria. “O principal tributo, o ICMS, tem crescido acima de 8% na média dos últimos três meses. O mês de setembro ficará registrado como a maior arrecadação da história do Estado em um único mês, com cerca de R$ 450 milhões. Isso tem sido possível graças ao foco em gestão, planejamento e empenho de todos os servidores do Estado”, garante Ademário.

O Governo intensificou ações de combate à sonegação com a criação e implementação do Conselho Inter-Institucional de Recuperação de Ativos – Cira –, órgão colegiado que visa recuperar dívidas de ICMS, contribuindo para reduzir sonegações fiscais. “As ações já executadas, segundo ele, têm gerado resultados positivos e melhorado, sensivelmente, o ambiente econômico, reaquecendo a economia e gerado empregos”, reforça.

Afinal, o que pensam Belivado Chagas e Valadares Filho do futuro?

O governador Belivaldo Chagas também acredita que Sergipe já vive dias melhores quando o assunto são as finanças públicas. “E a partir de janeiro, o Estado estará em melhores condições ainda, pelo fato de já estarmos empreendendo ações que buscam o reequilíbrio das finanças, muito embora tenhamos muito ainda a fazer”, admite Belivaldo.

De acordo com o governador, ainda esse ano, a partir do resultado das eleições, será encaminhada à Assembleia Legislativa uma proposta de reforma administrativa, com redução de cargos, secretarias, diretorias e órgãos e, com isso, enxugaremos a máquina, para que possamos governar de forma mais leve e moderna a partir de janeiro”, acredita.

Belivaldo assegura que o Governo está “fazendo o dever de casa”, melhorando a situação para o exercício a partir de janeiro de 2019, com o reequilíbrio das contas em andamento. e a proposta de reforma aprovada. “Tudo isso fará com a gente tenha condições de governar de forma mais tranquila”, reforça.

REFORMA

Questionado sobre como se dará essa reforma administrativa, o governador admite que ainda não tem os detalhes, pois só passará a tê-la como prioridade a partir do resultado – positivo, no caso – das urnas. “Vou ouvir os gestores, mas o objetivo é o de diminuir o tamanho da máquina, pois não dá para governar com o Estado arrecadando menos e gastando mais”, pondera.

Segundo Belivaldo, traçar essa reforma será o segundo ato dele como governador reeleito. O primeiro será ir a Brasília, na segunda-feira, dia 29, um dia depois das eleições. “Vou conversar sobre as emendas com a bancada federal, buscar acordos junto ao orçamento, priorizando as áreas de saúde, educação e segurança pública. Em paralelo, vou deixar um grupo de trabalho esboçando a reforma para quando eu retornar, analisar e concluir para encaminhar à Alese”, afirma.

O objetivo de Belivaldo é o de já reassumir o Governo com uma nova estruturação. “Com o incremento de arrecadação com o ICMS e a cobrança junto a sonegadores, além da repactuação de valores. Tudo isso fará com que continuemos avançando, e assim teremos, já no primeiro ano, condições de ter voltar a investir e a gerar emprego e renda”, espera.

INCOMPETÊNCIA DOS GESTORES

O candidato Valadares Filho não acredita muito nesse cenário pintado por Belivaldo. “O governo de Sergipe não é transparente, consequentemente não temos acesso a todas as informações, mas as que temos dão conta da situação difícil do Estado, que só será resolvida com gestão, como outros Estados conseguiram”, diz Valadares Filho.

De acordo com ele, o contexto atual, de crise fiscal e financeira, é fruto da incompetência administrativa de Jackson Barreto e Belivaldo Chagas. “É um contexto muito difícil, mas estou muito otimista e tenho convicção de que, com gestão, independência, meritocracia, formação de uma equipe qualificada, enfim, com medidas que vamos tomar já no início do governo, vamos muda-lo”, reforça Valadares.

Apesar de estarem em lados opostos, as medidas de ambos caminham na mesma direção. “Essas medidas, que já penso para o primeiro mês de governo, passam pela redução drástica de cargos comissionados e de secretarias, assim como por uma ampla reforma administrativa, a melhora na distribuição do custeio e do fim das mordomias da máquina pública. Só assim vamos conseguir regularizar as finanças e pagar os salários dos servidores e apesentados já dentro do mês, a partir de janeiro”, promete.

O fato é que nenhum dos candidatos, por melhor que seja, conseguirá resolver os problemas de Sergipe de uma hora para a outra, como num passe de mágica. E é preciso ter consciência disso para não se ter, a partir de 2019, uma sociedade fadada à frustração. “A mudança vai ser lenta, não dá para esperar um milagre. A melhoria na economia do Estado não depende de ação direta do governo, mas ele pode, sim, fomentá-lo”, pondera Paulo Pedroza.  

Valadares Filho acredita que o atual cenário é fruto da falta de gestão dos governos Belivaldo e Jackson

MELHORIAS

Para se ter ideia, nos últimos quatro meses, o governo desenvolveu uma série de atividades de combate à sonegação e conseguiu resultados efetivos: segundo Paulo Pedroza, entre maio e agosto deste ano, houve crescimento de 8% do ICMS comparado ao mesmo período de 2017. Além disso, só no último mês de setembro, o ICMS cresceu 23% com relação ao mesmo mês em 2017.

Paulo não tem dúvidas de que isso ocorreu em virtude das três grandes operações que o Governo realizou. “A crise continua, a economia não melhorou, o que melhorou foi a fiscalização, com a presença mais efetiva do fisco junto aos setores produtivos do Estado. Isso repercutiu de imediato na arrecadação”, avalia.

Por isso, para ele, o Governo precisa manter essa política. “Tem que ser constante. É preciso fortalecer o funcionamento da Secretaria da Fazenda e ter essa prática de mais vigilância e eficiência na fiscalização. Não se trata de aumentar a carga tributária, e sim combater a sonegação”, atesta.

MUDANÇAS

Questionado sobre se o Governo foi omisso ao não realizar essas operações antes, o presidente do Sindifisco diz que, na verdade, ão políticas diferentes que cada gestor adota. “Tivemos mudança no governo. E houve mudança também na Secretaria”, justifica Paulo Pedroza.

O fato é que o Governo Jackson Barreto/Belivaldo Chagas pode ter enxergado tarde demais que as finanças do Estado estavam em frangalhos – mesmo com todos os fortes indícios.

“O cenário do Estado é o de uma economia em retração. Temos visto que a realidade do Brasil é a mesma, com as atividades econômicas em retração, principalmente a industrial, mas também os setores de comércio e de serviços”, analisa.

QUAL DOS DOIS

Para avaliar bem as propostas econômicas de ambos os candidatos que foram ao segundo turno, o Sindifisco os convidou para um debate com a categoria. “Valadares Filho apresentou as propostas e garantiu que elas são de fortalecimento dessas políticas”, afirma Paulo. Belivaldo não pôde comparecer, mas isso, segundo Paulo, não apaga a sua experiência.

“Os dois candidatos têm conhecimento. Valadares Filho é deputado, já conhece a estrutura, tem um grupo que conhece a economia do Estado, o pai foi governador. Belivaldo também demonstra conhecer, tanto que houve essa mudança, temos que reconhecer. Mas é na prática que poderemos ver quem implementa as medidas e toma as decisões corretas. Porque é isso que é preciso: ter decisão política e investir no melhoramento da Secretaria”, reforça.

O economista Bruno Setton também aposta na experiência da prática para salvar as finanças do Estado. “Os dois candidatos, ao meu entender, têm condições. Mas, particularmente, penso que Belivaldo detém melhores condições devido à experiência, ao fato de estar no Executivo, conhecer a estrutura do Estado, os mecanismos. Nesse sentido, acredito que ele sai na frente de Valadares filho, que também tem grande experiencia, mas como legislador”, argumenta.

INTERLOCUÇÃO

Para Bruno, esse cenário requer, além da experiência, boa interlocução com os atores do orçamento público, da programação orçamentária. “Então, acredito que Belivaldo tem certa vantagem. É um palpite. Nada impede que Valadares também tenha essa condição”, ressalta.

Paulo Pedroza, do Sindifisco, afirma que, independentemente de quem seja o próximo governador, ele deverá priorizar as ações que devem ser tomadas. Para isso, o futuro governador deverá, na opinião de Paulo, criar condições de incentivo, assim como infraestrutura adequada, com estradas, energia elétrica, distritos industriais, crédito para os pequenos e médios produtores agrícolas e empresários. “Com isso, incentivará a economia regional e estadual”, acredita.

Já no âmbito das finanças públicas, Paulo afirma ser necessário ter uma política efetiva de combate à sonegação, que garanta que os recursos dos impostos cheguem aos cofres públicos, “porque eles são fundamentais para a realização das políticas públicas que, por sua vez, também têm esse papel de fomentar a economia”.

PLANO DE RECUPERAÇÃO

O atual secretário de Estado da Fazenda, Ademário Alves, que assumiu pouco depois de Belivaldo virar de fato o governador, em abril, diz que o Governo já vem fazendo um trabalho em duas linhas de atuação bastante definidas: a de enfrentamento às despesas, visando a redução do custeio mensal, sem reduzir a qualidade do serviço prestado, e a outra que objetiva elevar as receitas, ordinárias e extraordinárias.

Um dos pontos altos do Governo em prol do restabelecimento da saúde das finanças públicas foi, sem dúvida, a elaboração do Plano de Recuperação Econômica e de Geração de Empregos, um planejamento estratégico de ações que visam atingir uma economia anual de até R$ 200 milhões, além de ações que objetivam o aumento da arrecadação, de modo a reequilibrar o orçamento do Estado, gerar empregos e renda para a população.

Segundo Ademário, muito do que foi proposto no Plano já está em execução, como a retomada de obras, de investimentos, da própria arrecadação de impostos e do zelo com os recursos públicos. “A boa gestão dos recursos públicos possibilitou, em pouco tempo, que dezenas de obras fossem iniciadas em todo o Estado e outras tantas reiniciadas, melhorando a qualidade de vida das pessoas e contribuindo para a geração de empregos”, afirma Ademário.

Belivaldo Chagas espera, já em 2019, ter condições de voltar a investir e a gerar emprego e renda

TRIBUTAÇÃO

Mas não é só isso. O economista também destaca a redução do crescimento das receitas tributárias, especialmente daquelas que advém do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS. “Essa combinação da crise nacional, da redução do FPE com o encolhimento das receitas tributárias faz com que a gente tenha um cenário muito pessimista”, admite.

Em 2014, por exemplo, foram gastos cerca de R$ 830 milhões para cobrir o déficit de receitas previdenciárias do setor público. “É uma despesa previdenciária crescente, que não acompanha o aumento da despesa. Essa situação tem elevado os gastos com pessoal, fazendo com que o Estado tenha ultrapassado o limite prudencial de gasto com pessoal em relação à corrente liquida”, afirma Bruno Setton.

Para piorar o cenário, dados de 2016 mostram que a dívida consolidada líquida era de 60%. “Ela está relacionada ao elevado comprometimento do orçamento com gastos obrigatórios, notadamente despesa de pessoal. E mais especificamente ainda a despesa dos inativos”, ressalta Bruno. Dessa forma, a saída, de acordo com Bruno, é adequar as despesas à receita, evitando que as contas públicas fiquem expostas ao cenário nacional.

PROBLEMA ESTRUTURAL

“A gente vê que não se trata de uma crise proveniente de estoque de dívidas do passado. É um problema estrutural relacionado aos gastos obrigatórios, que não deixam flexibilidade no orçamento para poder manejar”, explica. Esse será, na opinião de Bruno, o desafio do próximo gestor.

“Um futuro governo tem que priorizar dois pontos: tentar equalizar essa questão do déficit previdenciário e buscar meios de fomentar a arrecadação. Porque não adianta equacionar os gastos obrigatórios e não ter mecanismos para aumentar a receita, se não fica a vida toda refém de recursos do governo federal”, destaca.

Segundo Bruno, o aperfeiçoamento do controle da arrecadação é uma das medidas mais urgentes. “Existem muitos devedores dentro do Estado, e por mais que o fisco tente trabalhar em cima disso, há muitas grandes empresas, grandes indústrias que devem ao fisco estadual. É preciso cobrá-las, buscar dinamizar a economia e criar parcerias para minimizar esse cenário”, atesta.

ALTA SONEGAÇÃO

Paulo Roberto Pedroza de Araújo tem a mesma opinião. Ele é presidente do Sindicato do Fisco do Estado de Sergipe - Sindifisco - e diz que esse é exatamente o maior problema detectado pela entidade. “Esse cenário não é novidade, vem se arrastando ao longo dos anos e não se vislumbra uma retomada da economia muito acentuada em 2019. Mas há um problema grave, que é a sonegação de impostos. A empresa pratica as atividades, lucra e não recolhe os impostos”, critica Paulo Pedroza.

De acordo com ele, esse cenário é perigoso, porque se o Estado não tem fiscalização eficiente, a prática vai se repetir, se consolidar. “Mesmo diante de uma atividade econômica fraca, tem que ter uma arrecadação, porque o Estado depende disso. Imposto é um custo, é pago pelo consumidor, está embutido no valor do produto/serviço, então é obrigação do empresário, na apuração de lucros, saber que o imposto não pertence a ela. Mas não é o que está acontecendo”, lamenta Paulo.

Apesar de grave, segundo Paulo, esse cenário tem solução sem grandes complexidades. “Depende apenas de decisão política”, assegura. Isso porque, na opinião dele, os governantes já conhecem essa realidade. “O Sindifisco não está falando coisa nova”, reforça.

DECISÃO POLÍTICA

A teoria dele é de que os governantes não têm essa decisão política de combater a sonegação, porque existe uma relação do poder econômico dentro do Estado. “Os empresários têm seus representantes na Assembleia, no Congresso, fazem o lobby e acabam fazendo as ingerências no Estado para evitar essa ação”, teoriza.

Na verdade, o próprio discurso do empresariado casa bem com a prática da sonegação. “Há uma reclamação geral de que a carga tributária do país é alta. Isso é um engano. Se formos comparar a carga tributária do Brasil com relação ao PIB, ela é de 32%. Nos países da Europa, como a Dinamarca, chega a 50%. O Brasil está em 20º lugar no ranking em carga tributária”, aponta.

De acordo com Paulo, a alta sonegação prejudica muito a arrecadação do Estado e, consequentemente, as finanças públicas. Por isso, na opinião dele, será dever do próximo governante intensificar a fiscalização. “O Estado tem como melhorar o trabalho da fiscalização, só depende da vontade, porque nós temos um quadro de servidores do fisco em quantidade suficiente – são 490 auditores fiscais. O que falta é estrutura e decisão política”, reforça.

Ademário Alves: Governo vem fazendo um trabalho de enfrentamento às despesas e de elevação das receitas