Reportagem Especial

Tatianne Santos Melo

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O que o Coronavírus está tentando nos dizer?

Pandemia de Covid-19 tem provocado reflexões em diversas áreas e já tem como saldo uma vasta rede de solidariedade. O que virá de novo no pós-tudo isso?

Poucas pessoas devem ter visto ao longo de suas vidas o Centro Comercial de Aracaju assim vazio, como na foto, alguma vez. A imagem é bastante emblemática para o período de pandemia de Covid-19 que o mundo enfrenta. São tempos diferentes, que têm causado reflexões diversas e profundas.

“A gente foi colocado numa posição diferente da que estávamos acostumados e cada um pode parar para refletir sobre o que é possível aprender com tudo isso. Será que aquela rotina, antes tão corrida e intensa, fazia bem? Será que não ter tempo para si mesmo e para a família faz mesmo bem?”, questiona a jornalista e influenciadora Iana Queiroz. 

Para Iana Queiroz, nesse momento é possível ver a vida por outros ângulos. “A forma mais leve de passar por isso é acreditar e confiar que tudo está acontecendo para um bem maior. O momento é tenso. Estranho, mas que pode culminar em grandes mudanças e na valorização de coisas que realmente importam”, reforça Iana. Pode valorizar, também e inclusive, o pânico.

Prefeitura de Aracaju e Governo do Estado adotaram medidas que mudaram a rotina das pessoas
Marcelo Ennes: “o significado de nossa vida, inclusive em relação ao nosso corpo, é antes social do que biológico”

RESPONSABILIDADE

Para isso, Marcelo Ennes parte da dimensão mais evidente dessa tragédia pode ser medida na própria ação humana no coletivo. “O contágio e as mortes avançam em todo o mundo. Mas isto não é responsabilidade apenas do vírus, que não se propagaria sem o contato humano. Isto é, um novo vírus surgiu, mas a tragédia em curso é um reflexo de como a sociedade reage a ele”, avalia o sociólogo.

Segundo Marcelo Ennes, esta situação ajuda aos leigos e aos iniciantes a entenderem o que a Sociologia estuda: os vínculos entre as pessoas. “A sociedade consiste em indivíduos vinculados social, econômica, religiosa, política e culturalmente. E isto é quase sempre invisível, não tangível”, destaca.

Significa dizer que na Sociologia estudamos algo invisível aos olhos nu, assim como o vírus. “E como ele, só sabemos que a sociedade existe quando ela se impõe sobre a nossa rotina, sobre o nosso cotidiano, quando algo revela que as coisas não dependem apenas de nós mesmos e de nenhum indivíduo isoladamente”, analisa.

CONVIVÊNCIA

De acordo com Ennes, sociologicamente é possível diagnosticar a pandemia de uma forma bem didática: há um vírus, este vírus está nos indivíduos, os indivíduos convivem, esta convivência ocorre em vários tipos e níveis de arranjos sociais, tais como famílias, empresas, escolas, igrejas, vizinhança, bairros, cidades, países, continentes, globo terrestre...

“Os indivíduos e os grupos estão em relações de interdependência. Estas relações são mediadas por normas, sejam elas morais, religiosas, legais. Estas normas são fruto do jogo entre estes indivíduos e grupos, jogo no qual prevalece a vontade e o interesse dos mais poderosos”, avalia o sociólogo.

Marcelo Ennes continua: “se estes elementos são reais e se estes arranjos de interdependência são verdadeiros, o que importa mesmo sobre o nosso futuro em relação à Covid-19 é basicamente como vamos reinventar nossos vínculos e quais as normas que irão prevalecer”, completa.

FUTURO

Traduzindo para um plano mais visível e mais tangível, o que Marcelo Ennes está dizendo é que o futuro da sociedade depende de se ela vai manter o distanciamento social ou se vai promover o contato físico entre as pessoas nas escolas, nas empresas, nas igrejas, nos shopping centers, nos estádios de futebol, etc.

“Estes dois tipos de vínculos sociais - a distância/virtual ou físico/presencial - serão decisivos para o nível de contágio e para o número de mortos. Ocorre que esta decisão depende do jogo de forças acima referido e definirá o que e quem vai prevalecer e sobreviver”, explica Marcelo Ennes.

Mas, afinal, o que isso explica? “Que são concepções de sociedade. De novo: indivíduos e grupos sociais que se interconectam de formas específicas a depender do jogo de forças e da distribuição de poder entre os envolvidos. Por exemplo, o que justifica a opção pelo contato físico/presencial é o pressuposto de que contato gera contágio e que o contágio produz imunidade”, esclarece.

Padre João Cláudio: “trata-se de uma tempestade sem precedentes”

PREÇO

Significa, segundo ele, que pessoas serão contaminadas e mortas, mas que este é um custo menor do que os pago pelo distanciamento e virtualização momentânea dos vínculos sociais. “Isto é, os defensores desta dinâmica de relações humanas em tempo de pandemia calculam que os custos serão menores do que os gerados pela manutenção das relações à distância/virtual”, reitera.

No entanto, segundo Ennes, o que a Sociologia faz indagar é que tipo de sociedade que estas pessoas e estes grupos defendem ou simplesmente acreditam ser a única possível. É a concepção segunda a qual a morte é um custo necessário para a manutenção da sociedade, ou de parte dela. Ou seja, da parte superior, da parte eleita, da parte mais forte.

“Acreditam que a morte é seletiva e que ela vai atingir os mais fracos de modo a depurar a sociedade, assim como é na natureza. Mais uma vez, a Sociologia é chamada para responder. Esta lógica não tem nada de natural e sim uma tentativa de explicar o social por uma suposta lógica da natureza”, ressalta.

JOGO DE FORÇAS

Na realidade, acrescenta ele, não é a natureza “Como não é o vírus em si que a causa a pandemia, o contágio e morte. São as formas como a sociedade, em outras palavras, são os interesses que prevalecerão neste jogo de forças que definirá quem, quando e quantos morrerão”, reforça.

Eis como a Sociologia contribui para a solução da pandemia. “Nós da Sociologia temos a capacidade de diagnosticar que a pandemia é antes social e que a maneira como irá evoluir não resulta não apenas da ação de um vírus, mas de como os indivíduos, grupos sociais e governos irão agir e se relacionar”, argumenta.

Este é, portanto, um limite da ciência e do uso das diferentes tecnologias produzidas pelos cientistas. “A implementação de nossas respostas foge ao nosso desejo e à nossa vontade e, a não ser como cidadãos, não podemos influenciar ou determinar o uso dos resultados de nossos estudos em benefício da vida da maioria e não de poucos privilegiados”, assegura.

ASPECTO RELIGIOSO

O padre João Cláudio da Conceição afirma que, na Bíblia, particularmente nos Evangelhos, é comum encontrar Jesus, no cotidiano da missão, proclamando a boa notícia da salvação, curando pessoas, realizando sinais e prodígios.

Segundo padre João Cláudio da Conceição, a vida de Jesus no Evangelho é repleta de encontros e um deles desperta atenção, pois Jesus está numa situação na qual não é comum vê-lo: Jesus está chorando. “A humanidade está enxergando Jesus chorando, desapontado pelos erros cometidos e pelo modo como tem sido tratada a mãe terra”, diz o padre.

De acordo com padre João Cláudio da Conceição, é isso que está acontecendo nesse momento de pandemia. “No início do Livro do Gênesis, Deus coloca a terra nas mãos da humanidade para que esta seja cuidada, para que surjam frutos e estes sejam partilhados. Ao longo dos séculos, a terra tem sido depredada e os frutos que derivam dos processos de dominação são apenas acumulados por poucos. Uma produção desumana tem ferido sistematicamente a finalidade, a alma da terra. Ou seja, a hospitalidade”, justifica.

Para o padre, os processos de produção redesenham uma terra que não tem sido a casa de portas abertas para acolher a todos. “Há um mecanismo econômico que fere a terra com as correntes da exclusão e isto faz Jesus chorar, ao ver tanta riqueza nas mãos de poucos e os Lázaros abandonados pelas ruas do Brasil e do mundo inteiro”, ressalta. Ou seja, para a Igreja, a face da terra está passando por uma forte turbulência. “Trata-se de uma tempestade sem precedentes”, resume o religioso.

Tecnologia tem ajudado as pessoas a manterem contato nesses tempos de isolamento

PREÇO

Significa, segundo ele, que pessoas serão contaminadas e mortas, mas que este é um custo menor do que os pago pelo distanciamento e virtualização momentânea dos vínculos sociais. “Isto é, os defensores desta dinâmica de relações humanas em tempo de pandemia calculam que os custos serão menores do que os gerados pela manutenção das relações à distância/virtual”, reitera.

No entanto, segundo Ennes, o que a Sociologia faz indagar é que tipo de sociedade que estas pessoas e estes grupos defendem ou simplesmente acreditam ser a única possível. É a concepção segunda a qual a morte é um custo necessário para a manutenção da sociedade, ou de parte dela. Ou seja, da parte superior, da parte eleita, da parte mais forte.

“Acreditam que a morte é seletiva e que ela vai atingir os mais fracos de modo a depurar a sociedade, assim como é na natureza. Mais uma vez, a Sociologia é chamada para responder. Esta lógica não tem nada de natural e sim uma tentativa de explicar o social por uma suposta lógica da natureza”, ressalta.

JOGO DE FORÇAS

Na realidade, acrescenta ele, não é a natureza “Como não é o vírus em si que a causa a pandemia, o contágio e morte. São as formas como a sociedade, em outras palavras, são os interesses que prevalecerão neste jogo de forças que definirá quem, quando e quantos morrerão”, reforça.

Eis como a Sociologia contribui para a solução da pandemia. “Nós da Sociologia temos a capacidade de diagnosticar que a pandemia é antes social e que a maneira como irá evoluir não resulta não apenas da ação de um vírus, mas de como os indivíduos, grupos sociais e governos irão agir e se relacionar”, argumenta.

Este é, portanto, um limite da ciência e do uso das diferentes tecnologias produzidas pelos cientistas. “A implementação de nossas respostas foge ao nosso desejo e à nossa vontade e, a não ser como cidadãos, não podemos influenciar ou determinar o uso dos resultados de nossos estudos em benefício da vida da maioria e não de poucos privilegiados”, assegura.

ASPECTO RELIGIOSO

O padre João Cláudio da Conceição afirma que, na Bíblia, particularmente nos Evangelhos, é comum encontrar Jesus, no cotidiano da missão, proclamando a boa notícia da salvação, curando pessoas, realizando sinais e prodígios.

Segundo padre João Cláudio da Conceição, a vida de Jesus no Evangelho é repleta de encontros e um deles desperta atenção, pois Jesus está numa situação na qual não é comum vê-lo: Jesus está chorando. “A humanidade está enxergando Jesus chorando, desapontado pelos erros cometidos e pelo modo como tem sido tratada a mãe terra”, diz o padre.

De acordo com padre João Cláudio da Conceição, é isso que está acontecendo nesse momento de pandemia. “No início do Livro do Gênesis, Deus coloca a terra nas mãos da humanidade para que esta seja cuidada, para que surjam frutos e estes sejam partilhados. Ao longo dos séculos, a terra tem sido depredada e os frutos que derivam dos processos de dominação são apenas acumulados por poucos. Uma produção desumana tem ferido sistematicamente a finalidade, a alma da terra. Ou seja, a hospitalidade”, justifica.

Para o padre, os processos de produção redesenham uma terra que não tem sido a casa de portas abertas para acolher a todos. “Há um mecanismo econômico que fere a terra com as correntes da exclusão e isto faz Jesus chorar, ao ver tanta riqueza nas mãos de poucos e os Lázaros abandonados pelas ruas do Brasil e do mundo inteiro”, ressalta. Ou seja, para a Igreja, a face da terra está passando por uma forte turbulência. “Trata-se de uma tempestade sem precedentes”, resume o religioso.

Marcos Carvalho: “como cristãos, temos que olhar por essa população invisível que está nas ruas”

MAS, E DEPOIS?

Para o sociólogo Marcelo Ennes, é complicado prever o que virá depois dessa pandemia. “Seria um pouco de futurologia”, diz. Mas, por outro lado, ele acredita que o cenário pós-pandemia já está se desenhando. “A maneira como as pessoas estão agindo já sinaliza que há uma maior preocupação com a vida, apesar de todas as consequências econômicas que, com certeza, vão existir”, afirma.

Isso demonstra, segundo Ennes, que a maioria coloca a vida acima do fator econômico. “Também acho que tudo isso tem aproximado as pessoas. Que todo o distanciamento causado por questões políticas e ideológicas nos últimos anos parece que está sendo sobreposto pela preocupação com as pessoas: parentes e amigos de quem você se distanciou”, destaca.

Marcelo Ennes acredita que o futuro vai depender das consequências disso tudo, da avaliação de quem tinha mais razão, a ciência ou essa visão econômica que tem tentado dominar os debates. “Acho que nesse cenário é possível que as universidades, a ciência, voltem a ser mais respeitadas e mais valorizadas, porque a solução vai ser pelo conhecimento nas várias áreas”, opina Ennes, que tem tratado sobre o assunto em seu blog, o maennes.blogspot.com.

De fato, em momentos de crise coletiva, é natural que a humanidade se questione, reflita e enxergue novas possibilidades de existência. E, com todo o mundo levantando causas e consequências com relação à doença e se perguntando o que, afinal, o novo Coronavírus está tentando mostrar ou ensinar, talvez a sociedade saia dessa crise com conceitos que poderão ajudá-la a melhorar, a longo prazo, politica, economica e socialmente.

Iana Queiroz: tempo de grandes mudanças

DADOS

Ainda conforme informações da Secretaria, o maior número de visualizações é registrado em assuntos referentes às medidas adotadas pelo Governo para ajudar a população, com destaque para matérias sobre decretos estaduais, reportagens com ações econômicas adotadas pelo governador Belivaldo Chagas, além de grande número de visualizações nos boletins epidemiológicos.

“Isso demonstra que as pessoas estão buscando as fontes oficiais para se informar e esclarecer dúvidas. Além disso, comprova o papel importante e social do jornalismo”, disse o chefe de Redação da Secom do Governo de Sergipe, Eduardo Andrade. O professor titular do programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tiradentes, Alexandre Chagas concorda.

“O WhatsApp ganhou um acesso mais denso, as pessoas estão praticamente 24 horas trocando mensagens por meio desse aplicativo. Acredito que um percentual considerável de pessoas que, porventura, não assistia ou não consumia tanto informação passou a fazê-lo”, analisa.

ASPECTO HUMANO

Mas ainda há coisas que a interação virtual não pode realizar, como a entrega de alimentos e kits de higiene a pessoas carentes nesse período. E essa tem sido a rotina de Marcos Correa de Carvalho, estudante de Serviço Social e coordenador da Pastoral da Rua da Igreja Católica Apostólica Romana. Junto ao grupo Socorristas do Bem, Marcos Correa tem distribuído, diariamente, cerca de 300 refeições - almoço e jantar - e kits de higiene pessoal.

O grupo se reúne há cerca de dois anos, mas, nessa pandemia de Covid-19 tem atuado mais intensamente com o objetivo de prover a alimentação diária de centenas de pessoas em diversos bairros de Aracaju. “Nós levávamos pessoas em vulnerabilidade social para a Paróquia, mas, para evitar aglomeração, estamos indo ao encontro delas, levando comida durante o dia e à noite. Levamos sopa, pão, sanduíches, água, refeições e kits de higiene”, revela Marcos.

Os principais bairros visitados pelo grupo são Atalaia, Coroa do Meio, Treze de Julho, Centro e região dos Mercados, Bairro industrial, Getúlio Vargas e Siqueira Campos. “Geralmente, encerramos ali próximo ao Hospital Municipal Nestor Piva”, diz Marcos, um dos responsáveis por cortar a cidade para entregar os alimentos.

SOLIDARIEDADE

Todos os alimentos e kits de higiene pessoal são frutos de doações. “Eu moro perto ao Mercado e não tem como não ver o sofrimento das pessoas que estão nas ruas. Comecei a levar comida e ganhei o apoio de muitas pessoas, como o da doutora Ana Lúcia Teles e dos Socorristas. Com isso, as doações aumentaram bastante. Nós não pedimos dinheiro e sim alimentos, o que facilita muito a adesão das pessoas”, afirma o coordenador da Pastoral.

Cerca de 50 pessoas estão envolvidas com esse projeto atualmente. São pessoas comuns, que entendem a necessidade de ajudar a quem precisa nesse momento. “Como cristãos, temos que olhar por essa população invisível que está nas ruas, precisamos trabalhar essa indiferença, acolher a quem precisa, a quem mais tem problema, sofre mais injustiça e discriminação”, ressalta.

Para Marcos, essa pandemia tem mostrado, na prática, que a união faz a força, como diz o ditado. “E Aracaju está sendo referência. Foi uma das capitais que pegaram o projeto-piloto que criamos e investiram nos abrigos que a Prefeitura está fazendo. Já são mais de 70 pessoas abrigadas. Não é só o assistencialismo, mas também apresentar políticas públicas a essa população”, reitera.

Solidariedade: doações ajudam grupos a alimentar a quem precisa