Reportagem Especial

Tatianne Santos Melo

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Sergipe corre tardiamente atrás das PPPs

Governador e prefeitos da Capital e da Grande Aracaju dão os primeiros passos na direção dessas parcerias. Mas timidamente, o que leva oposicionistas, como Milton Andrade, verem Sergipe na estaca zero


PPP. Você pode até não saber o que essa sigla significa, mas certamente já a escutou em algum discurso político por aí. É que a tão falada PPP, que significa Parceria Público-Privada, é hoje a grande esperança de muitos gestores. Como os cofres públicos estão falidos, resta aos administradores recorrer à iniciativa privada para ajudar a realizar projetos importantes, mas onerosos demais.

Regidas pela Lei 11.079/04, as PPPs estão sendo implantadas em diversos Estados e municípios do Brasil. Em Sergipe, o governador Belivaldo Chagas, PSD, também não esconde a necessidade de alinhamento com a iniciativa privada. Desde que assumiu, ele admite as dificuldades do Estado e busca resolvê-las a partir dessa parceria.

“Estamos em fase de implantação de um projeto bem estruturado nas áreas de PPPs e Concessões. A sociedade exige serviços públicos de qualidade e os governos, seja federal, estadual ou municipal, não possuem condições financeiras de prover essas necessidades sozinhos”, diz Belivaldo Chagas.

Milton Andrade: “nas PPPs não há a figura do aditivo contratual, nem o atraso na construção da obra”
Milton Andrade: “nas PPPs não há a figura do aditivo contratual, nem o atraso na construção da obra”

BARRA

A Barra dos Coqueiros é outra cidade metropolitana que, segundo o prefeito Airton Martins, tem interesse em implementar PPPs. De acordo com Airton, embora haja a necessidade delas, ainda não há, no campo prático, uma ação efetiva. “Temos interesse em tudo que seja para o crescimento da Barra e para a melhoria do povo”, diz ele.

Airton acredita que as PPPs são fundamentais nesse momento de estagnação financeira dos municípios. “A situação está muito difícil”, ressalta. Mas, segundo ele, o desemprego ainda é o maior desafio que a gestão enfrenta - mesmo com a implantação da Celse - Centrais Elétricas de Sergipe S.A.

“Nosso papel é buscar soluções para esses problemas e tudo que venha para ajudar, será bem-vindo. Nesse ou no próximo ano, deveremos intensificar essa busca por PPPs, pois a Barra está crescendo muito e precisa de projetos estruturantes”, reconhece o prefeito.

Barra dos Coqueiros: interesse sim, planejamento não

NOVAS SOLUÇÕES

O município de Nossa Senhora do Socorro também acredita ter obras e projetos que podem ser contemplados com uma PPP. De acordo com o prefeito Inaldo Luís da Silva, o Padre Inaldo, PCdoB, o projeto de iluminação pública em LED e a construção de uma Unidade de Pronto Atendimento – UPA – são alguns deles.

“Nosso município comporta esse tipo de parceria, mas ainda não temos nada planejado nesse âmbito”, admite o Padre Inaldo. Segundo ele, por enquanto, as ações conjuntas entre setor público e privado no município se restringem à adoção de praças, como a do João Alves, adotada pela Ecoar – uma associação da Torre Empreendimentos –, e a do Marcos Freire II, que deverá ser adotada pela Construtora Celi.

O conceito dele para as PPPs é o da maioria dos gestores: o de que a parceria pode ajudar significativamente os gestores e às gestões. “São uma boa solução para os governos resolverem muitos problemas”, acredita Padre Inaldo. Edvaldo Nogueira confirma. “Eu acredito firmemente nas parcerias e vejo nelas a solução para muitos problemas. Sozinhos, não resolvemos nada”, avalia.

Padre Inaldo: “são uma boa solução para os governos resolverem muitos problemas”

IMPEDIMENTOS

Mais uma vez, como lembrou Milton Andrade, a segurança jurídica surge como um impedimento à efetivação das PPPs na esfera sergipana. “Os empresários precisam ter, quando eles estabelecem condicionantes, garantias de que não haverá quebra de contrato. Esse é o grande problema no estabelecimento de uma PPP. Porque a parceria requer a garantia de que o contrato não será quebrado”, reforça Marcos Santana.

Marcos diz que, por isso, uma PPP requer um prazo de maturação bastante alongado. “Inclusive, nas discussões que travamos, pensamos em securitizar essas garantias. E o que significa isso? A Prefeitura contrataria um seguro para minimizar um prejuízo causado por uma possível quebra de contrato. É de fato o grande problema nesse estabelecimento, é a falta de credibilidade do setor público no tocante à manutenção dos contratos assinados por um determinado administrador que pode ser quebrado por outro”, explica.

Segundo Marcos, esse cenário impõe a necessidade de estabelecer parâmetros que, mesmo que não impeçam, dificultem ao máximo a possibilidade de um gestor, à frente, ir contra a parceria. “Esse é o grande calcanhar de Aquiles no estabelecimento desse tipo de parceria”, reconhece.

Segundo o prefeito, Socorro comporta PPPs em algumas áreas, mas ainda não há nada concreto

INVESTIMENTOS

Para Marcos, essas parcerias são imprescindíveis para o desenvolvimento do município, até porque, segundo ele, o próprio momento de estagnação econômica não permite aguardar que as decisões que são tomadas em Brasília possam gerar alguma consequência que venha a estabelecer uma nova realidade para o município. “Por isso, nós não estamos parados”, garante.

“Estamos buscando não somente PPPs, mas empresários para que eles invistam na cidade com empreendimentos e indústrias. Nós temos contatos com um grande Grupo de Sergipe, o Maratá. Já tivemos duas reuniões com eles. Também já tivemos uma reunião, recentemente em Brasília, com o Grupo Petrópolis, que produz a cerveja Itaipava”, complementa.

De acordo com o prefeito, as PPPs podem ser, hoje, estabelecidas em todas as áreas, embora ele tenha priorizado algumas. “Nós apresentamos três possibilidades: Mercado Municipal, que é um mix de mercado e centro comercial, um Centro Administrativo, onde há um ganho fundamental de escala mesmo, teria um ganho com a racionalidade do gasto com energia elétrica, transporte, uma série de coisas. Também na área da gestão do Turismo, que é inovador, estabelecer uma gestão privada para o turismo, para os equipamentos turísticos da cidade”, diz Marcos. 

Um dos projetos em que a PPP cairia bem é o Centro de Convenções, cuja obra se arrasta há anos

SUBESTIMADAS

De fato, aparentemente, as PPPs têm tudo para ser grandes aliadas das administrações públicas, que sozinhas, seja por incompetência, falta de recursos ou mau uso deles, já não conseguem realizar as obras estruturantes necessárias para o desenvolvimento das cidades.  

Nesse momento, como afirma Nogueira, o papel e a forma de governar são diferentes, o que requer soluções igualmente diferenciadas. “Agora, temos que funcionar como âncoras, fazendo as ligações, as interlocuções que viabilizem resultados positivos com custos menores. O poder público já não tem recursos para tudo, portanto, tem que buscar parceiros e usar criatividade”. Que assim seja.

No entanto, para serem efetivas e, posteriormente, funcionarem, é preciso que os gestores sonhem com PPP sabendo o que ela significa de fato, sob o risco de empreenderem esforços descomunais para investimentos que pouca ou nenhuma diferença farão em suas comunidades.

Airton Martins: “Barra está crescendo e precisa de projetos estruturantes”

CAPITAL

De fato, o tempo é fator crucial e os municípios sergipanos também estão correndo atrás desse tempo perdido. Edvaldo Nogueira, prefeito de Aracaju, garante que a cidade já tem algo concreto nesse sentido.

“Nossa gestão, que usa soluções criativas em várias áreas, também vem adotando as PPPs com esses objetivos. Costumo dizer que hoje só se governa com eficiência e resultados se levarmos em conta ideias que se encontram fora dos padrões vigentes até então”, diz Edvaldo.

Alguns exemplos são o Banese, que atuou em parceria para a realização do Réveillon 2017 e 2018; o Grupo Assaí, que realizou a revitalização de praças; o Shopping Riomar, na abertura e pavimentação da rua José Augusto Barreto, e a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, com a cessão do prédio para a instalação da nova sede da Fundat.

AMPLIAR PARCERIAS

“E uma outra importante iniciativa pela via das PPPs é com a Fecomércio, que nos últimos dois anos vem apoiando a realização do Natal Iluminado, na iluminação decorativa de alguns locais durante o período natalino”, destaca Edvaldo Nogueira.

A expectativa, segundo o prefeito, é a de manter essas parcerias que já existem e estendê-las para outras áreas. “O papel do gestor moderno é o de funcionar como um âncora, liderando o processo de interação com os setores produtivos, e eu tenho feito isso. Mas também temos clareza de que, com essa forte crise que atinge o país já há alguns anos, o sucesso dessas parcerias é ainda limitado”, pondera.

Mas, como modelo no enfrentamento de dificuldades e promoção de serviços, Edvaldo tem apostado cada vez mais nele. “Até porque o poder público vem enfrentando o esvaziamento de suas tradicionais fontes de financiamento”, opina.

Na Prefeitura de Aracaju, as iniciativas estão acontecendo nas áreas de infraestrutura, saúde, entretenimento e turismo, mas o propósito do prefeito é o de que este princípio de somação com o terceiro setor se estenda a todas as áreas. “Desde que, obviamente, preservando os interesses dos cidadãos, com ética e transparência em todas as PPPs celebradas”, diz.

Cidade turística, São Cristóvão quer PPP para projetos da área

SERVIÇOS

Em qualquer lugar do mundo, para Milton, esses seriam fatores de riqueza. “Mas os governos já demonstraram que não têm qualquer aptidão para gerir e elas poderiam ser exploradas pela iniciativa privada”, diz.

As PPPs também poderiam ser importantes na prestação de serviços administrativos que custam caros a população e geralmente são mal prestados. “Saúde, educação, penitenciárias e modernização administrativa são áreas que apresentam déficit na qualidade e custo dos serviços”, reitera.

No momento, as prioridades deveriam ser, na visão de Milton, além do Centro de Convenções e do Ceasa, a modernização administrativa: uma estrutura, física e digital, onde o empresário que quisesse abrir uma empresa apresentaria uma única vez toda sua documentação, através da internet e todos os órgãos fariam sua análise em um prazo determinado. “Toda essa estrutura gerida pelo parceiro privado”, ressalta.

PLANEJAMENTO

As áreas de turismo e logística também poderiam trazer um retorno rápido e com baixos investimentos. “Venho defendendo também a PPP no saneamento básico, na captação de água e nas usinas de reciclagem (o fim dos lixões). Ah, também das rodovias. Enfim, da infraestrutura e desburocratização do Estado”, reitera Milton.

Para ele, a principal dificuldade para que isso aconteça é a falta de planejamento e competência. “As empresas em Sergipe não estão fechando somente por conta da crise no Brasil. A crise em Sergipe é muito mais severa, exatamente pela falta desses dois componentes”, reitera.

Milton ressalta que o Governo Federal tem um programa de parceria em investimentos cuja diretrizes são ferrovias, rodovias, aeroportos, portos, energia elétrica, mineração, óleo e gás, entre outros. “Qual tem sido nossa articulação com o Governo Federal nesse sentido? Quem cuida das PPPs aqui em Sergipe? Além de decisões para PPPs, precisamos de velocidade para implantá-las”, atesta.

Edvaldo: “papel do gestor moderno é o de funcionar como um âncora, liderando o processo de interação com os setores produtivos”

REGULAMENTAÇÃO

Para além disso, segundo Milton Andrade, elas precisam ter contrato superior ao valor de R$ 10 milhões e com duração superior a cinco anos. Também são vedados os contratos que tenham como objeto somente o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública.

A remuneração do parceiro privado depende do desempenho e da quantidade e qualidade dos serviços prestados, medidos por indicadores de desempenho pré-estabelecidos. “Geralmente cada Estado tem sua própria lei que regulamenta a PPP local, sempre com base na lei federal”, esclarece.

É por isso que, aqui em Sergipe, Milton diz que “não avançamos nada”. É que o Estado tem apenas a legislação – “e muita conversa”, segundo Milton. Para ele, isso ocorre por dois problemas básicos: a falta de projetos concretos e de garantias que devem ser prestadas nos contratos, que serão utilizadas em caso de atraso nos pagamentos.

INSEGURANÇA

“Minas tem sido um dos Estados que mais avançaram nesse sentido. Desde 2003, Minas tem realizado PPP de sucesso nas áreas de transporte, educação, sistema prisional, atendimento ao cidadão, entre outras. Vários municípios têm utilizado as PPPs para melhorias no sistema de iluminação pública e coleta de resíduos sólidos. Piauí começou os estudos juntos com Sergipe. Lá tem mais de 30 parcerias. Aqui, nenhuma”, compara Milton.

O motivo? Exatamente a falta de segurança. “Investidor gosta de segurança, de regras claras e transparentes, e somente um bom planejamento faz com que isso aconteça”, aponta. E para ter segurança e regras claras, é necessário, segundo Milton, que o governo demonstre seu interesse no desenvolvimento de uma área específica e dê reais condições para o empresário cumprir o planejado.

“Alguém saberia dizer de imediato quais são os focos de atuação do governo de Sergipe para o desenvolvimento do Estado? E olha que não faltam órgãos para fazer esse planejamento!”, critica. “Temos um porto que não agrega valor nenhum à nossa economia, um potencial enorme na área de gás e de turismo, geração de energia, ferrovias”, completa.

Edvaldo: “papel do gestor moderno é o de funcionar como um âncora, liderando o processo de interação com os setores produtivos”

VANTAGENS

O empresário Milton Andrade, coordenador do Fórum Empresarial de Sergipe, tem a mesma visão. Milton é um verdadeiro entusiasta das PPPs e acredita que elas podem modernizar as gestões públicas, já que se trata de um contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada - que divide o custo entre tarifa dos usuários e pagamento pelo ente público – ou administrativa – toda custeada pelo ente público –, de serviços ou obras públicas.

Para Milton, uma coisa interessante nas PPPs é que o governo demonstra o interesse em uma área e convida, publicamente, os interessados a apresentarem os projetos para seleção, diferentemente da licitação, onde quem faz o projeto é o governo.

“Uma outra vantagem é que nas PPPs não há a figura do aditivo contratual, nem o atraso na construção da obra ou prestação dos serviços, pois nos dois casos quem ficará com o prejuízo será a empresa escolhida”, explica.

 LEGISLAÇÃO

Todos os projetos de que o governador falou ainda estão no campo teórico, porque, no momento, o governo está debruçado na confecção de marcos legais e regulatórios modernos e que garantam uma relação sadia entre os atores.

O objetivo é promover, de forma legal, uma boa prestação de serviços para a sociedade por um preço justo e com segurança jurídica para os investidores. “Caso contrário, eles nem aparecem”, ressalta.

Segundo Belivaldo, o Estado também está buscando uma agência reguladora com força suficiente para manter o equilíbrio dessa equação. “Há vários exemplos maduros Brasil afora e estamos em busca das melhores práticas. Após essa fase, iremos ao mercado oferecer aos players. Estamos formando uma equipe com pessoas muito capazes e eficientes”, revela.

Aracaju está focada em realizar PPPs em diversas áreas

SÃO CRISTÓVÃO

Assim como Aracaju, o município de São Cristóvão busca nas PPPs a realização de alguns projetos. No primeiro ano do mandato, o prefeito da cidade, Marcos Santana, MDB, convidou vários empresários de todos os setores do Estado de Sergipe para apresentarem alguns projetos. Alguns se interessaram e fizeram inclusive estudo de mercado.

“Desde 2017, colocamos a possibilidade de fazermos Parcerias Público-Privadas com relação ao Centro Administrativo do Município, ao Mercado Municipal do Eduardo Gomes e também à gestão de turismo. Estamos abertos para outras propostas. Essas são as justificativas que colocamos da nossa ótica, mas se algum empresário ou grupo perceber outro setor que ele entende ser viável, a gente está aberto”, ressalta Marcos Santana.

A Construtora Heca, por exemplo, se interessou, realizou um estudo de mercado, estabeleceu algumas condicionantes. “Já tivemos aqui também a visita de Luciano Barreto, da Celi, que também estabeleceu algumas condicionantes. Uma delas é a infraestrutura rodoviária. Então, não adianta estabelecer um investimento alto em turismo se não se tem rodovias de acesso com segurança, conforto e acessibilidade. Já conversamos com empresários de Portugal, com um grupo de investimento do Paraná”, revela.

Marcos Santana: “o grande problema nesse estabelecimento é a falta de credibilidade do setor público no tocante à manutenção dos contratos”