
Mas que diabos tem a ver Carlos Gardel com a economia?
Carlos Gardel ficou para a história como o mais famoso cantor de tango. Intérprete do “tango canção”, levou o ritmo, argentino por excelência – sem entrar nas controvérsias que sempre surgem sobre origens de ritmos ou estilos musicais – ao sucesso mundial. Acabou virando unanimidade na Argentina. O primeiro ícone do panteão que inclui Maradona e Messi.
Mas que diabos tem a ver Gardel com a economia? Nada. Muito menos com o Prêmio Nobel. Mas tango, Argentina, economia e política formam uma combinação especial, geralmente associado a tristeza, decepções, tragédias e fortes emoções. Em um mecanismo complexo. Como um bom tango. Música e dança.
As eleições argentinas são o enredo de uma tradicional letra de tango. A decepção com o amor antigo, o surgimento de uma nova paixão, a probabilidade de, não importando a decisão, o final ser melancólico. É nesse clima que se enfrentam o peronismo e o denominado “anarco- capitalismo”.
Sou um admirador da Argentina. Para além das belezas naturais e proximidade geográfica, o país possui um charme especial. Decadente é verdade. Mas como dizia a letra de Lobão - “Decadence avec Elegance”. E apesar da tradicional rivalidade, é óbvio que os argentinos são melhores que nós no futebol (pelo menos atualmente), no cinema e no vinho. Eles também possuem Nobel. Nós não.
Demorei a entender o que significa o peronismo para os argentinos. Me parecia que não importava a posição ideológica, todos eram, antes de tudo, peronistas. Algo parecido com o antigo MDB. Salvo diferenças importantes, o Juan Domingo Perón me parecia com o “similar nacional” Getúlio Vargas. Ambos “pai dos pobres” e nacionalistas.
Com a vantagem para o argentino de ter uma primeira dama – Evita – mas carismática que o marido. Golpes, assassinatos e mortes trágicas. E o peronismo vira uma instituição sagrada. Assumindo, com vária denominações – como o kirchnerismo - a maior parte da condução política e econômica da Argentina nestes quase 90 anos.
A grande ameaça ao peronismo e seus ismos de ocasião é Javier Milei, economista argentino que se denomina “anarco–capitalista”. Tenho dificuldades em entender como expressões antagônicas possam, em conjunto, expressar alguma coisa minimamente coerente. É como o anúncio que vi recentemente do lançamento da “picanha vegana”. Tenho amigos veganos e apreciadores da picanha – de nelore, preferencialmente. Nenhum dos dois grupos ficou interessado com a novidade. É melhor ficar com a opção original.
Tenho também dificuldades em dar o mínimo de credibilidade, em relação a política econômica, a rompimentos radicais. Servem mais para chamar atenção do que, de fato, alguma possibilidade prática de execução. Mas há também um outro problema, muito parecido com as rupturas radicais. A manutenção, principalmente em relação à política econômica – de conceitos e práticas comprovadamente ultrapassados. Nesse caso, os “religiosos” e “iconoclastas” são a as faces diferentes da mesma moeda.
Ao final, a eleição argentina, como a maioria das eleições, terá como pano de fundo a velha frase: “é a economia, idiota!”. No caso dos nossos vizinhos, como um bom tango, a decepção e/ou a tragédia, farão, como nunca, parte do enredo.
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