Articulista
José Roberto de Lima Andrade

É economista e professor da UFS. Escreve às sextas.

Microeconomia sergipana: Cachorro Quente de Seu João e barreiras à entrada
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Seu João e seu famoso cachorro quente

Reli esta semana um artigo sobre “O Cachorro Quente do Seu João”, escrito pelo saudoso jornalista Amaral Cavalcante. Acredito que é difícil para alguém que tenha vivido na Aracaju dos anos 1970 a 1990 do século passado e não tenha experimentado aquilo que certamente foi um dos ícones da gastronomia sergipana.

Amaral Cavalcante faz uma descrição perfeita do Cachorro Quente do Seu João - “Metade de um pão jacó recheado com carne frita picadinha, batatinha pra fazer volume e uma profusão de alface. Nem salsicha tinha!..”.

Na minha infância, o roteiro gastronômico Rua Campos-Centro-Rua Campos começava pela Sorveteria Cinelândia e terminava no Cachorro Quente do Seu João no parque, no oitão da Catedral - e vai grafado assim em caixa alta e baixa porque ele é uma instituição afetiva da nossa gastronomia.

Há quem considere uma inversão natural da sequência salgado-doce. Mas estamos falando de Aracaju. Era o nosso “jeito aracajuano de comer”. Nada estranho. Conheci um professor Suíço que tinha um queijo “de estimação” e que o consumia como sobremesa. Cada qual com seu cada qual.

Costuma-se dividir a economia em duas grandes áreas. A macroeconomia, talvez a mais popular, trata dos grandes agregados econômicos como moeda, PIB, e de políticas que afetam o desempenho econômico, como a fiscal e monetária. É a economia que discutimos e ouvimos no dia a dia.

A microeconomia trata do comportamento dos chamados “agentes econômicos” - pessoas, empresas, governo. Menos popular, mas não menos importante. Particularmente acredito que os economistas, na sua maioria, enxergam a microeconomia mais como um conjunto de regras e leis - muitas já ultrapassadas -, que uma área de estudo capaz de promover o desenvolvimento econômico.

Como consequência, perdemos espaço para outras profissões - administradores como exemplo - que se dedicam com mais afinco ao estudo destes agentes, principalmente consumidores e empresas.

Retornando ao Cachorro Quente de Seu João. A parte da microeconomia que trata das empresas é chamada de “Teoria da Firma”. Sem a pretensão de dar uma aula de economia, as empresas agem diferente em “estruturas de mercado” diferentes.

Se traduzirmos estruturas de mercado como concorrencial, oligopólio e monopólio, o economês passa a ficar mais claro. Esclarecendo um conceito popular que muitas vezes induz a uma compreensão incorreta, não se trata apenas da quantidade de empresas para definir uma estrutura de mercado.

Para ser um monopólio - de verdade – não basta apenas existir uma única empresa. O produto que ela comercializa não pode ter substituto próximo. Combustível por exemplo. Se há apenas um posto de gasolina em uma cidade, esse é um monopólio “de verdade”. Essa realidade vale para uma estrutura concorrencial -popularmente definida como muitas empresas - ou oligopolizada - poucas empresas.
E a empresa Cachorro Quente de Seu João Ltda? Em que estrutura de mercado estaria inserida? Longe de ser um monopólio. Mesmo na Aracaju dos anos 1970 a 1990 do século passado, uma ruma de gente vendia cachorro quente. E nem só de cachorro quente vive o homem.

Mercado concorrencial? Longe também, já que o Cachorro Quente de Seu João não era mais um no meio da multidão. Seu João era um oligopolista! Isso mesmo: Seu João conseguiu criar na economia o que chamamos de barreira a entrada. O pão jacó? O molho de carne secreto? Nem mesmo o brilhante Amaral Cavalcante conseguiu definir.

Temos centenas de barreiras à entrada no mundo mais sofisticado dos livros e artigos de economia. Muitas vezes definidas por publicidade, em outros casos por patentes. Enfim, por critérios que muitas vezes só a psicologia do comportamento do consumidor pode explicar. E assim nos tornamos fiéis e pagamos mais caro por um bem ou serviço. Com prazer. Como um Cachorro Quente do Seu João do Parque.

Foto: Destaque Notícias

 

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Genival Nunes
Eu saia da faculdade (onde hoje é a Adema) e caminhava até o parque; “jantava” o cachorro quente de seu João e pegava a Kombi que me levava ao trabalho. A TV Sergipe foi meu primeiro emprego. Empapuçado pelo cachorro quente , ele me dava “sustança” para varar a madrugada exibindo filmes e novelas para o deleite da população sergipana. ia da UFS onde cursava Biologia (prédio onde hoje é a Adema) e caminhava até o parque; “jantava” o cachorro quente de seu João e pegava a Kombi que me levava ao trabalho. A TV Sergipe foi meu primeiro emprego. Empapuçado pelo cachorro quente , ele me dava “sustança” para varar a madrugada exibindo filmes e novelas para o deleite da população sergipana. Nota: belíssima relação da economia com a história dessa cidade .