Articulista
José Roberto de Lima Andrade

É economista e professor da UFS. Escreve às sextas.

O mundo é um moinho
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Cartola, um dos maiores compositores brasileiros

Cartola, um dos maiores compositores brasileiros, gênio da raça, compôs uma música nos anos 70 do século passado chamada “O mundo é um moinho”. Cantor e compositor que fez sucesso já em idade avançada, a música fez sucesso na voz de outros intérpretes como Beth Carvalho, Cazuza e Nei Mato Grosso. A letra é uma alerta para as consequências das escolhas da afilhada de Cartola. De como os sonhos podem ser destruídos rapidamente.

Os acontecimentos recentes, principalmente a guerra entre Israel e o Hamas, trouxeram-me à tona duas reflexões: a primeira, de como é grande a quantidade de informações e de opiniões sobre algum tema – de analistas a formadores de opinião, passando pelos famosos grupos de whatsapp (principalmente) – todos parecem ter opiniões, consolidadas, sobre temas diversos – de geopolítica do Oriente Médio a economia.

Um caso interessante são as opiniões sobre economia. Recentemente li um artigo sobre juros nos EUA e desempenho da bolsa brasileira [i]. O senso comum – dentro e fora dos “experts” em economia -, é o de que a elevação dos juros nos EUA tende a prejudicar o desempenho da bolsa brasileira. Sem entrar em detalhes, o argumento “popularmente aceito”, é o de que haverá uma fuga de capitais em relação aos títulos públicos americanos, retirando como consequência investimentos em empresas brasileiras.

O autor desmonta a “lógica popular” revelando que os dados dos últimos 30 anos monstram exatamente o contrário. Fatos são fatos. A realidade se sobrepõe ao que o autor chama de “indústria de explicação”, que se alimenta de si mesma, com explicações que se julgam auto-evidentes, mesmo que não haja nenhuma evidência.

Para além da guerra, outro fato importante foi a escolha do novo Nobel de Economia. Assunto de interesse restrito a economistas (a minoria inclusive). Costumo dizer aos meus alunos que tudo que é importante na vida tem destaque em noticiários (blogs,sites,jornais etc) e Nobel. A ganhadora deste ano foi a economista e professora de Harvard, Claudia Goldin. O Nobel premiou o trabalho da professora sobre a desigualdade de gênero no mercado de trabalho, principalmente, em como este desequilíbrio se agrava desfavoravelmente para as mulheres logo após o nascimento do primeiro filho.

Tenho uma tese de que prêmios Nobel normalmente premiam trabalhos sofisticados, nas mais diversas áreas, sobre temas que vivenciamos corriqueiramente no dia a dia. O de medicina premiou pesquisa sobre biologia do RNA que possibilitou o desenvolvimento de vacinas contra a Covid 19. O de química, sobre “pontos quânticos”. Certo dia fui comprar uma TV e tinha alguns modelos que falavam desse negócio. Pense em uma coisa cara. Quem sabe criam um Nobel para quem baratear os preços. No curto prazo.

Voltando ao impacto da guerra entre Israel e o Hamas. A sensação que tenho é que os ciclos se repetem, mas cada vez mais rápido. O moinho gira em uma velocidade cada vez maior, trazendo a tona e ao fundo rapidamente acontecimentos de paz, guerra, prosperidade, crise, pandemias, descobertas científicas...

Os últimos cinco Prêmios Nobel de Economia foram sobre trabalhos distintos em áreas como combate a pobreza, crises financeiras e papel dos Bancos Centrais, metodologia em ciências sociais, eficiência nos mercados. Sinal da pluralidade da Academia de Ciências? Ou os problemas mudam com mais rapidez?

Simone, minha esposa, tem uma frase que repete com frequência sempre que me assusto com certos acontecimentos – o mundo sempre foi assim. Só mudou a velocidade das ocorrências. Talvez esse seja o novo normal.

[i] O artigo intitulado “Quando os juros sobem nos EUA, é ruim para a bolsa brasileira? Não!. Autoria de Herique Bredda, Portfolio Manager da Alaska Asset Management.

 

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