Articulista
Mário Sérgio Félix

É radialista, jornalista e pesquisador da MPB. Escreve às quintas.

O que fez a Jovem Guarda implodir?
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TV Record inaugura um novo ciclo nas tardes de domingo com o Programa Jovem Guarda

Quando Roberto Carlos lançou o LP “Jovem Guarda”, talvez não tivesse a dimensão do movimento que estava criando e liderando.

Por uma frase de efeito, que fez todo jovem repetir freneticamente e que virou título de canção - Quero que vá tudo pro inferno -, estava o mote para que o movimento viesse com tudo mudar modas e costumes do povo brasileiro.

A TV Record era detentora dos direitos de transmissão do futebol paulista e todo domingo jogos do campeonato de São Paulo estavam em evidência. Acontece que com o desentendimento entre a Record e os responsáveis pelo futebol, a televisão foi impedida de transmitir esses jogos.

O buraco na programação da TV gerou uma corrida urgente para colocar no ar um programa que atendesse ao apelo desses telespectadores que estavam órfãos da programação aos domingos.

Um cabeludo estava despontando no movimento musical que fazia algum sucesso entre os jovens e trazendo um “som” diferente daquele que estava em evidência no país.

Seu LP denominado “Jovem Guarda” já atingia um volume de vendas acima do normal no mercado fonográfico brasileiro. Seu nome: Roberto Carlos.

Suas gírias, seu comportamento, sua roupa, tudo aquilo parecia mostrar um novo momento musical que ainda acompanhava o modismo da Bossa Nova.

A Tropicália ainda estava por vir e o Sambalanço sofria com a concorrência da Bossa Nova e do próprio Samba.
Com o surgimento da Jovem Guarda através de Roberto Carlos, surgem com ele seus acompanhantes de toda uma carreira, Erasmo Carlos e Wanderléa.

Com essa turma, a TV Record inaugura um novo ciclo nas tardes de domingo com o Programa Jovem Guarda.

É nesse momento que a música brasileira acompanha um novo jeito de cantar, de compor, de dançar, enfim, costumes são modificados para atender uma nova tendência que nascia com força.

Com a Jovem Guarda, surgem novos cantores, cantoras, compositores e compositoras que aderem ao movimento com o mesmo espírito criado por Roberto.

Renato & Seus Blue Caps, The Fevers, Os Incríveis e outros conjuntos fazem sucesso com a mesma dimensão do agora contemplado “O Rei da Jovem Guarda”.

Outros nomes, a exemplo de Jerry Adriani, Wanderley Cardoso, Ed Wilson, Ronnie Von e tantos e tantos outros tornam-se sucessos assim como o Rei Roberto Carlos. A cena estava pronta e parecia indesmontável.

O movimento durou três anos de bastante intensidade. Os shows pelas capitais e também no interior do país eram de grande sucesso.

O movimento também era sucesso em venda de discos, colocando Roberto Carlos à frente dessa vendagem, colocando a gravadora CBS como grande campeã, até porque a maioria dos artistas estava ligada a essa gravadora.

Mas, por que a Jovem Guarda implodiu? Por que um movimento que tinha uma ligação muito intensa com a classe jovem sucumbiu?

Dizer que a Jovem Guarda acabou porque Roberto Carlos não queria mais apresentar o Programa é muito vago. Estamos no ano de 1968 e o momento político no Brasil já não era o mesmo, embora o governo tivesse a mesma identidade.

Roberto já não é mais o mesmo de “Quero que vá tudo pro inferno”. Renato & Seus Blue Caps não é mais o mesmo de “Menina Linda”. Ronnie Von já não enfrenta “A Praça” com o mesmo ímpeto.

Erasmo não se identifica mais com “O Pica Pau” e Wanderléa já não canta “Foi Assim”. Os tempos são outros.
Roberto começa a discutir o relacionamento conjugal quando grava “Madrasta”, de Renato Teixeira. Ronnie Von não quer ficar parado na praça, resolve chamar seu amigo “Flash Gordon” para lhe salvar.

A viagem é muito legal. Erasmo prefere ficar mais envolvido com um namoro mais envolvente, declarando “Você vai ser o meu escândalo”. E Wanderléa? Bem, a Ternurinha quer se desgarrar dos parceiros amigos e irmãos e encontrar novos parceiros, a exemplo Egberto Gismonti, Gonzaguinha, e outros e outros.

Mas, e Renato & Seus Blue Caps? E os “viúvos” e as “viúvas” da Jovem Guarda? Os remanescentes do movimento não conseguiram se firmar com a saída de Roberto Carlos e sua trupe, porém continuaram com as músicas desse momento. Aliás, momento que começa a declinar por conta do próprio movimento.

Certa vez em entrevista concedida a mim pelo contrabaixista Paulo César Barros, ele revelou que os shows continuavam acontecendo, principalmente no interior do país. Porém, e aqui existe um porém, os contratos com ainda os grandes nomes da Jovem Guarda começam a ser reduzidos de forma a não fazer jus aos cachês que esses artistas pleiteavam.

Empresários desses artistas reduzem os valores desses contratos de maneira vertiginosa, que começa a tornar inviáveis as apresentações.

Por esse momento, o próprio Paulo César resolve deixar o conjunto e ingressar, com bastante sucesso na banda do Rei, o RC-7.

Os artistas envolvidos no movimento começam a dispersar para outros movimentos. A música romântica ganha as canções de Wanderley Cardoso, Jerry Adriani; Sérgio Reis adere ao movimento sertanejo; o próprio Erasmo se engaja na onda do rock e a Ternurinha, flerta com o samba e se casa com a MPB. Aí, sim, o movimento Jovem Guarda começa a ser sepultado.

 

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