
Preservar e defender os regimes democráticos como valor universal da humanidade
Em homenagem à Declaração Universal da Democracia, aprovada pela União Interparlamentar em setembro de 1997, a Organização das Nações Unidas - ONU -, por meio da Resolução A/62/7, estabeleceu 15 de setembro como o Dia Internacional da Democracia, celebrada em 128 países, com intuito de provocar reflexão acerca da importância dela para o mundo.
Como direito básico de cidadania, a democracia é o ambiente político ideal para desenvolvimento pleno daquela em sua mais ampla dimensão, a ser exercido em condições de liberdade, igualdade, transparência e responsabilidade, com o devido respeito à pluralidade de pontos de vista.
Tudo isso no interesse da comunidade, independentemente de diferenças culturais, políticas, sociais e econômicas, com o objetivo de preservar e promover a dignidade e os direitos fundamentais do indivíduo, alcançar a justiça social e fomentar o desenvolvimento econômico e social da coletividade, reforçando a coesão social e a tranquilidade da nação, proporcionando o equilíbrio interno, para criar um ambiente favorável à paz internacional.
O objetivo da data é promover a conscientização acerca da necessidade de preservar e defender os regimes democráticos como valor universal da humanidade. Independentemente de inclinações político-ideológicas, penso que a democracia é a premissa básica para a civilização e desenvolvimento da sociedade.
Por outro lado, não pode ser interpretada de forma absolutista. O argumento democrático não pode servir para matar a própria democracia. O limite da democracia é ela própria. O conceito é complexo por estar em permanente construção em suas múltiplas dimensões, bem como é alvo de disputas políticas e apropriações oportunistas que agravam a sua captura pelo senso comum. Mas é, sobretudo, definição mal compreendida e desvirtuada ao longo dos tempos, desde a democracia grega.
Em suma, democracia pressupõe vontade da maioria com respeito de minorias. Nesse contexto, deve ser compreendido o papel dos três poderes constituídos num Estado Democrático de Direito. O Executivo exercido legitimamente pelo eleito pela maioria do povo. O Legislativo representando o povo em sua mais diversa pluralidade e os estados federados em sua institucionalidade. Por sua vez, o Judiciário como baliza imparcial de segurança jurídica.
Em especial, tem-se o papel contramajoritário do Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição Federal e bastião garantidor do direito de minorias para que não sejam aniquiladas por eventual ditadura supremacista da maioria democrática.
Essa é uma das interpretações atuais do pensamento do filósofo francês Montesquieu, em o “O Espírito das leis”, baseado nas obras de Aristóteles e John Locke, na Revolução Francesa, quando traçou o sistema de freios e contrapesos para equilibrar harmonicamente a tripartição dos poderes, evitando o despotismo.
Nessa busca, desde os founding fathers, o federalismo estadunidense procurou criar mecanismos de controle recíproco dos poderes, atribuindo-lhes funções atípicas para evitar a criação de um superpoder, a chamada teoria do check and balances, que influenciou o constitucionalismo brasileiro.
Hoje, a discussão em voga guarda relação com o tal protagonismo judiciário frente aos demais poderes, o que tem impactado sensivelmente a percepção do conceito de democracia.
A propósito, não deve valer a frase sarcástica de Millôr Fernandes, segundo a qual “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”. Prefiro, talvez romanticamente, a ideia de Montesquieu: “o amor da democracia é a igualdade”, compreendendo esta aristotelicamente, conforme semeada pelo nosso Rui Barbosa, para tratar desigualmente os desiguais na justa medida de suas desigualdades. Afinal, a maior desigualdade é tratar a todos indistintamente.
Enfim, críticas e releituras sempre pairarão sobre o conceito, como a consideração ácida de Nelson Rodrigues: “A maior desgraça da democracia é que ela traz à tona a força numérica dos idiotas, que são a maioria da humanidade”, ou a frase de Ivone Boechat, quando sentencia: “Democracia sem educação é anarquia”.
Contudo, muitas análises são motivadas pelo oportunismo disfarçado, em defesa do status quo tradicional, ao ponto de Carlos Drummond de Andrade asseverar: “Democracia é a forma de governo em que o povo imagina estar no poder”.
Por fim, como preciso encerrar essa primeira abordagem sobre esse tema apaixonante, que é interminável e será revisitado em nossas viagens aqui, não posso deixar de trazer à reflexão a famosa frase proclamada em 1947, na Câmara dos Comuns em discurso proferido por Winston Churchill: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”. E aí, leitor(a), você concorda com o então primeiro ministro inglês?
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