Aparte
Opinião - É hora de acabar com a farra dos barões dos jogos de azar, como o Jogo do Bicho

[*] Antonio Moraes e [**] Rafael Almeida


As contravenções penais são infrações penais tipificadas no Decreto-lei nº 3.688/1941 - Lei de Contravenções penais. Tais infrações penais são tratadas pelo sistema de segurança pública e justiça criminal como “infrações penais de menor potencial ofensivo”.

Em outras palavras, não recebem um tratamento rigoroso da legislação penal, no que se refere à punição dos autores. Há 72 artigos na referida lei, tipificando inúmeros comportamentos sociais como contravenções.

As penas cominadas na legislação são primordialmente prisão simples e pena de multa. A modalidade de prisão simples, com advento da Constituição Brasileira de 1988, foi declarada inconstitucional, sendo, portanto, impossível de ser aplicada. Logo, a única forma de punir os autores de contravenção penal é aplicando-lhes uma sanção de multa. Ou seja, ninguém será preso pela prática desse tipo de delito.

A doutrina penalista - estudos do Direito Penal - deu para as contravenções penais o “apelido” de “crime anão”. É fácil perceber que não há uma preocupação da legislação criminal, dos estudiosos do Direito Penal e, consequentemente, não há políticas públicas de segurança pública para o enfrentamento às contravenções penais.

A problemática que se estabelece é: “será que as contravenções penais não deveriam ser enfrentadas com mais atenção?”. Como já exposto, há inúmeros comportamentos previstos na lei como contravenção penal.

Não é objetivo do presente texto esmiuçar todos eles, mas chamar a atenção para a necessidade de uma política pública de endurecimento do combate à contravenção penal de exploração de jogos de azar, popularmente conhecido como “Jogo do Bicho”.

A prática do jogo do bicho se enquadra no artigo 51 da Lei de Contravenções Penais que diz ser contravenção penal “promover ou fazer extrair loteria, sem autorização legal”.

A norma estabelece como sanção a pena de prisão simples, de seis meses a dois anos, e multa, estendendo-se os efeitos da condenação à perda dos móveis existentes no local. Na prática, a condenação fica na multa e na perda dos bens utilizados para a prática delituosa.
A prática, à primeira vista, parece ser algo nada nocivo para a sociedade. Na verdade, já está presente no dia a dia de grande parte das cidades brasileiras, desde as grandes capitais até as pequenas cidades do interior.

Há quem diga que o jogo do bicho gera benefícios econômico e sociais. O discurso é o de que o jogo do bicho gera emprego, faz movimentar a economia. Tal discurso não passa de uma grande falácia, alimentada deliberadamente por barões que enriquecem sonegando impostos para fazenda pública e criando uma teia de crimes correlacionados.

O que está por trás do crescimento vertiginoso dos jogos de azar no Brasil não tem nada a ver com criação de emprego e distribuição de renda. Trata-se apenas de um grande assalto aos cofres públicos.

Dados da Organização das Nações Unidas – ONU -, estimam que a exploração de jogos de azar gera um prejuízo para o Brasil, somente em sonegação fiscal e evasão de divisas, da ordem de R$ 20 bilhões por ano. O montante do investimento em inteligência policial, no ano de 2021, é de R$ 1,9 bilhão.

Além disso, a exploração de jogos de azar alimenta uma indústria muito forte, que cresce cada vez mais - “a indústria de suborno e captação de agentes públicos e políticos para interesses escusos”.

Está cada vez mais notório a influência dos barões dos jogos de azar em instituições de Estado. O financiamento de campanhas eleitorais e o pagamento direto de propina a agentes públicos propiciam o aumento da influência de grandes criminosos nas decisões de políticas públicas, bem como no fortalecimento da impunidade no Brasil.

Os barões dos jogos de azar comandam os negócios à base da força, infringindo práticas diversas que vão desde ameaças, agressões físicas e assassinatos e, totalmente, à margem da lei. Os órgãos de controle, notadamente as polícias, ficam de mãos arramadas.

Não se tem política de segurança pública voltada para o enfrentamento à prática desse jogo. Os motivos? Alguns deles, já anteriormente expostos, são leniência da legislação, corrupção política e institucional.

Não é razoável pensar que crimes como sonegação fiscal, evasão de divisas, homicídio, extorsão, corrupção ativa e passiva sejam comportamentos não nocivos para sociedade.

Na verdade, parecem formar o núcleo central do problema da violência social no Brasil. Não é questão fácil encontrar a causa do fenômeno criminal no Brasil e nem é objetivo do presente texto discutir e apontar essa causa.

No entanto, é possível estabelecer um elo comum entre esses crimes. Um ponto em que todos eles estão presentes: exploração de jogos de azar. O jogo do bicho funciona como um elo, ponto de convergência, no qual todos os crimes acima descritos se reúnem.

Ora, o que fazer? Quebrar esse elo, esfacelar por completo o ponto de convergência. Portanto, são imprescindíveis medidas efetivas para o combate à exploração de jogos de azar.

Maior rigor punitivo da legislação, implementação de uma política de segurança pública voltada especificamente para a prevenção e investigação da exploração do jogo do bicho e os crimes correlacionados, como voltar atenção e esforços para a inclusão das pessoas que, infelizmente, necessitam se submeter ao sistema de exploração. É hora de acabar com a farra dos barões dos jogos de azar.

[*] É investigador e ex-presidente do Sinpol Sergipe [**] É investigador e ex-diretor do Sinpol Sergipe.

 

 

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