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Jozailto Lima

É jornalista há 40 anos, poeta e fundador do Portal JLPolítica. Colaboração / Tatianne Melo.

Opinião - O processo penal de Jesus de Nazaré 
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[*] Fabiano Pimentel 

Era quase meia noite quando, por detrás das árvores do monte chamado Getsêmani, surge Judas Iscariotes acompanhado por guardas de Roma e grande multidão de pessoas, armados com espadas e archotes, vindos por ordem do sumo Sacerdote Caifás, para efetuar a prisão de Jesus.

Levaram-no, primeiramente à presença de Anás, sogro de Caifás, que não era, oficialmente, o sumo sacerdote - Anás fora sumo sacerdote de 6-15 A.D. - por isso não poderia interrogar Jesus, não tinha jurisdição sobre ele. 

Não obtendo o que desejava, Anás remete Jesus à presença de José Bem Caifás, sumo sacerdote em exercício. Ocorre que, para se formular uma acusação no processo penal judaico, era obrigatório duas testemunhas e seus testemunhos deveriam ser concordantes - Deuteronômio 19:15.

Para obter as testemunhas necessárias ao libelo, Caifás e seus seguidores passaram a forjar uma acusação por meio de testemunhas falsas e que receberam dinheiro para mentir perante as autoridades.

Fora, então, Jesus interrogado pela segunda vez e agora acusado pelo crime de blasfêmia, o que implicaria numa confissão, devendo ser punido, segundo a lei judaica, com o apedrejamento - Levítico 24:14-16.

Mas as arbitrariedades não pararam por aí. Perante Caifás, improvisaram uma sessão extraordinária do Conselho durante à noite, o que era inadmissível no direito judaico até mesmo no julgamento de causas de natureza civil.

Mas tentavam com este expediente preparar o processo de culpa, sem qualquer interferência, e da forma que pudessem conduzir a uma condenação.

O Sinédrio, que era composto por 70 ou 72 anciãos e mestres da nação, poderia condenar alguém à morte, mas o governo romano teria que aprovar e executar a pena e, ao raiar do dia, todos os sacerdotes e anciãos reuniram-se em conselho para julgar Jesus e, amarrando-o, levaram-no à presença de Pilatos, que era o representante maior do governo romano na Judéia e governador de Jerusalém.

Jesus chega à presença de Pilatos, agora com uma nova acusação: a antiga acusação de blasfêmia é modificada para a acusação política no curso do processo acusatório. Jesus, agora não é mais aquele que se diz o filho do homem, que é igual a Deus, mas um conspirador que vai destruir o Império de César na Judéia. 

Uma verdadeira mutatio libeli, mudaram a acusação no meio processo de Cristo, sem dar-lhe a oportunidade de defesa ou de contrariar a prova.

Jesus já se encontrava previamente condenado quando Pilatos lhe perguntou: "És tu o rei dos judeus?". Respondeu Jesus: "Vim ao mundo a fim de dar testemunho da verdade - Jo 18:37". Pilatos pergunta-lhe: "O que é a verdade?".

Ora, Pilatos estava diante daquele que disse "Eu sou o caminho, a verdade e a vida", porém não conseguiu enxergá-la. Tinha a verdade ao alcance dos seus olhos, mas fora cegado pela sua ignorância.

Quantos juízes, nos dias de hoje, também encontram-se cegos e, embora vejam a verdade, não conseguem aplicá-la, muitas vezes por interesse no resultado do processo?

Ora, se Pilatos não via nele crime, por que não absolveu Jesus daquelas acusações infundadas? Se tinha dúvidas, por que condenou?

Porque teve medo da reação popular, preferiu a "paz social" à verdadeira Justiça, condenar um inocente à causar uma revolta social.

O ato de lavar as mãos era um costume judaico que, quando usado legitimamente, era símbolo de absolvição de um homem inocente de qualquer implicação com uma morte injusta. 

Pilatos quando lava suas mãos com água límpida, suja-as, pela sua omissão com o sangue de um inocente.

Jesus foi então levado à morte da forma mais vergonhosa possível: na cruz.

O processo de Jesus, desde sua prisão até sua condenação, foi um mar de injustiças. Uma acusação baseada em testemunhas falsas e argentárias; julgamentos noturnos, inadmissíveis na Lei Judaica; ausência de juizes; interrogatórios realizados por agentes incompetentes, que não tinham jurisdição sobre Jesus; tribunais singulares; mudança da acusação no meio do processo, foram algumas das arbitrariedades perpetradas contra o filho do homem.

Apesar dos anos, o julgamento de Cristo permanece marcado na sociedade como ilegal e violento, e os resquícios de ilegalidade ainda permanecem em muitos julgamentos atuais, quando a Justiça se mostra omissa e acovardada, assim como foi Pilatos.

Jesus, no fim da sua vida disse: "Tenho sede". Hoje, ainda temos sede de Justiça. Ao receber os pecados do mundo, Jesus disse: Eloí, Eloí, lamá sabactâni - Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?. Hoje, esta frase ainda é ouvida por muitos homens que se encontram desamparados pela Justiça...

[*] É advogado criminalista e professor de Processo Penal da UFBA e UNEB.

 

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João Novaes Filho
Excelente texto. Objetivo, esclarecedor e uma linguagem simples e bastante compreensível.
Lelê Teles
Muito bom
Róger Kbelera
Seu texto é simplesmente, extraordinário! O melhor e mais coerente que li até agora, neste ano! Parabéns e mto obrigado por essa "luz"!
Emanuel Cacho
Esse é meu garoto Fabiano Pimentel... grande criminalista