Aparte
Opinião - Luiz Fernando Ribeiro Soutelo: um patrimônio da Cultura sergipana

[*] Francisco Diemerson

Na mesma semana que se inicia o 47º Encontro Cultural de Laranjeiras, perdemos Luiz Fernando Ribeiro Soutelo, um dos seus maiores entusiastas e dedicado defensor que, inclusive, nesta edição iria presidir a conferência de abertura.

Ao me despedir do professor Fernando Soutelo nesta manhã de segunda-feira, 3 de janeiro, o sentindo de perda pessoal me é muito grande. Perdi meu avatar do fazer cultural. Um símbolo perene do cuidado com a memória, com os papéis e livros do passado. Com a coisa pública, ciente de sua responsabilidade como agente cultural e disposto a sempre construir pontes de diálogo e de debates.

Mas, também, sabia se manifestar com elegância e maestria para denunciar usos e abusos envolvendo o tratar do patrimônio histórico sergipano, assumindo suas posições com clareza e sem arrodeios.
Diria que perdi, também, o amigo-pai, que me guiou nos caminhos da burocracia, me ensinou o cuidado com as palavras, com o desenrolar da escrita em suas variadas utilizações. Que me apresentou às técnicas de investigação histórica, de esmiuçar jornais e livros em busca de pequenas fórmulas que permitissem a construção de roteiros sobre os eventos e as pessoas de Sergipe. Ele viu em mim, ainda adolescente, um historiador que demorei muito para aceitar.
Nascido no Rio de Janeiro, mas crescido em Sergipe, entre Estância e Santa Luzia, Fernando Soutelo exerceu diversas funções públicas. Aos 30 anos, foi o mais jovem presidente Conselho Estadual de Cultura, na década de 1970, função que exerceu outras cinco vezes, estando atualmente como representante do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e sendo presidente da Câmara de Patrimônio Cultural, tendo ali produzido mais de uma centena de pareceres e notas técnicas que são importantes documentos para os estudos culturais em Sergipe.

Levado pela professora Maria Thetis Nunes, ele foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e ocupou diversas vezes sua Diretoria, se movimentado pelos arquivos e corredores daquele antigo prédio com uma intimidade e uma paixão que encantavam todos os pesquisadores que lá aportavam e aos quais ele sempre se dispunha a orientar e a recomendar leituras e caminhos de escrita.
No cerimonial público, Luiz Fernando Ribeiro Soutelo encontrou uma paixão. Como um erudito, aplicou seu conhecimento histórico para modernizar o cerimonial brasileiro, rompendo com a ideia dos elogios enfadonhos e bajulatórios para colocar elementos de ordem e desenvolvimento político e social nos ritos estatais e sendo um formador de gerações de profissionais que hoje atuam neste serviço por todo país.

Em Sergipe, Fernando Soutelo foi chefe do cerimonial nos governos estaduais de José Rollemberg Leite e nos três de João Alves Filho, parceria repetida na Prefeitura Municipal de Aracaju, além do Tribunal de Justiça de Sergipe.

Luiz Fernando Ribeiro Soutelo escreveu diversos trabalhos sobre a formação das cidades de Estância e Santa Luzia, apresentando dados sobre suas fundações, famílias, ações políticas, que se tornaram referenciais para a pesquisa histórica sobre as mudanças no interior sergipano e a importância de seus principais polos urbanos.
Mesmo enfrentando um tratamento quimioterápico, não deixou de manter sua atuação no cenário cultural sergipano, mantendo uma rotina intensa de ações no Instituto Histórico e no Conselho Estadual de Cultura, sendo inclusive um dos autores do novo Regimento Interno, do anteprojeto da lei de proteção aos bens culturais e do Diploma do Mérito Cultural Epifânio Dória.

Todo esse panorama de sua atuação como homem público, porém não reflete imediatamente o mais importante detalhe de Fernando Soutelo: suas qualidades como amigo leal, conselheiro, cuidadoso e afetuoso, que até os idos de 2019 distribuía anualmente cartões de Natal para todos os seus queridos, que ligava no fim da tarde de domingo para contar causos da vida, o que rendia uma tarde inteira de conversas entre cafés e risadas.

Perdi meu pai intelectual. Perdi meu amigo. Perdemos um grande homem que é, sem dúvida, patrimônio da cultura de Sergipe, Estado infelizmente tão ingrato com os seus, mas que foi sempre uma inspiração para o trabalho de Fernando Soutelo. Por tudo, obrigado, mestre Luiz Fernando Ribeiro Soutelo!

[*] É professor e doutor em História Comparada, presidente do Conselho Estadual de Cultura, presidente da Academia de Letras de Aracaju e membro do Movimento Cultural Antônio Garcia Filho da Academia Sergipana de Letras.

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