Aparte
“Sinfonia da Desesperança”: a Covid-19 contada em vidas

[*] Edson Júnior

Em 7 de maio de 2020, quando a Covid-19 sepultava 8,5 mil seres humanos, o Jornal Nacional exibia um editorial muito apropriado sobre a esta doença. “Você já nem deve lembrar, mas na quinta passada eram 5.901 mortos. Os números vão aumentando desse jeito, cada vez mais rápidos, vão dando saltos, e vai todo mundo se acostumando porque são números”, alertou o editor-chefe e apresentador do JN, William Bonner.
De lá para cá esses números saltaram para 620 mil mortos. Um Airbus A380 possui capacidade máxima de 615 passageiros e fazendo uma analogia com o número de mortes da Covid-19, teríamos o equivalente à queda de mil aeronaves do tipo.
Fiz esse arrodeio para chegar ao livro “Sinfonia da Desesperança”, do jornalista, publicitário e poeta Carlos Cauê, lançado no entardecer da quarta-feira, 22 de dezembro, no Centro Cultural de Aracaju.
A obra reúne 12 crônicas ou contos que tematizam a Covid-19, colocando o leitor na cena da pandemia. Afinal, quem não teve um parente, um amigo ou um mero conhecido que não tenha sido vitimado pela doença?
Em “Remorso”, lá na página 71, o personagem Faustino tem um encontro com a verdade, “os tempos loucos que a humanidade estava vivendo já haviam começado a causar nele um desconforto que nunca sentira”.

“Era uma espécie de culpa tardia que se aproximava dele, como uma atmosfera gelada, que chegava devagar, enchendo o ar de uma névoa espessa ao seu redor, e que ele, decididamente, não podia mais ignorar”, escreveu Cauê.
Logo no início da pandemia, tive crises de ansiedade e ao ler essa crônica me vi como personagem dela, não por indiferença à doença. Ao contrário, sempre me importei com as vidas tragadas por ela e os efeitos causados às milhares de famílias que tiveram perdas, mas pela espreita silenciosa e invisível da Covid-19.
A sensação de ser calado, ou ter um ente querido levado a qualquer momento pela Covid-19, provocava em mim preocupação e medo. A escalada da doença e o sofrimento de quem duelava contra ela em casa ou em leitos de hospitais me provocavam angústia.
Muitas mortes empobreceram nossas vidas. No prefácio do livro, o jornalista Luciano Correia não poderia ser mais preciso. “A rigor, todo registro dos viventes contemporâneos que sobreviveram à pandemia da Covid-19, pela sua amplitude, ou pela tragédia dos números, é importante agora e sempre. Servirá, no mínimo, de testemunhos para a história, na dor dos que ficaram pela perda dos que se foram”, escreveu.  
“Sinfonia da Desesperança” é um alerta necessário para não perdermos de vista os números da Covid-19 e os estragos causados por ela.  
Toda tragédia deve estar viva em nós como lembrança e Cauê nos deixa essa vacina em suas 12 crônicas. Leitura saborosa que o leitor devora em uma só sentada.

[*] É jornalista.

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