EDUCAÇÃO
Por FOLHA DE S.PAULO ONLINE | 30 de Ago de 2017, 10h16
Governo Temer desiste de antecipar alfabetização do 3º para o 2º ano
A antecipação do ciclo estava prevista na versão mais recente da nova base nacional curricular, em fase final de preparação e que servirá de referência em escolas públicas e privadas
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Governo Temer desiste de antecipar alfabetização do 3º para o 2º ano

Estudante do ensino fundamental faz exercício de alfabetização em escola de São Paulo

O Ministério da Educação do governo Temer (PMDB) decidiu rever sua decisão de antecipar o término do ciclo de alfabetização do 3º para o 2º ano do ensino fundamental. A avaliação dos alunos, porém, será feita um ano antes do fim desse prazo.

A antecipação do ciclo estava prevista na versão mais recente da nova base nacional curricular, em fase final de preparação e que servirá de referência em escolas públicas e privadas.

O texto enviado em abril pelo ministério ao Conselho Nacional de Educação, órgão que analisa políticas para a área, previa que os alunos fossem alfabetizados até o 2º ano –correspondente à idade de sete anos.

O Plano Nacional de Educação, lei com metas para a área, coloca como parâmetro o 3º ano –equivalente aos oito anos de idade.

No conselho, a proposta do ministério enfrentou resistência. Ao longo de audiências públicas, secretários de Educação municipais reclamaram que, hoje, programas federais, como o Pacto pela Alfabetização na Idade Certa, levam em consideração o limite de oito anos.

Alfabetização no Brasil

Como é hoje
Alfabetização deve ocorrer até o 3º ano do ensino fundamental; avaliação nacional é feita no próprio 3º ano

O que o MEC queria
Antecipar a data-limite da alfabetização para o 2º ano do ensino fundamental

A controvérsia
No Conselho Nacional de Educação, prefeituras reclamaram que a mudança geraria problemas como repetência

Como vai ficar
Acordo prevê 3º ano como limite, mas escolas devem priorizar o tema nos dois primeiros anos. Exame nacional será feito no 2º ano

Um dos relatores da base no conselho nacional, César Callegari, secretário de Educação Básica do MEC na gestão Dilma Rousseff (PT), também vem se manifestando contrário à medida.
O processo de alfabetização, diz ele, tem que levar em conta a diversidade de contextos sociais dos alunos. Crianças que têm pais mais escolarizados, por exemplo, podem ter mais facilidade.

“Tenho convicção de que o 3º ano é o melhor momento, consideradas as diferenças de amadurecimento, repertório de casa e trajetórias das crianças”, diz. “Algumas crianças podem se alfabetizar antes, mas colocar um limite precoce pode produzir um conjunto de traumas”. Há ainda o risco, afirma, de aumentar a repetência nessa faixa etária.

Segundo ele, questões como essa serão levadas em conta na decisão do conselho.

A secretária-executiva do MEC, Maria Helena Guimarães de Castro, adianta, porém, que a pasta já chegou a um acordo com o órgão. Será uma espécie de solução intermediária. Por um lado, o capítulo da base relativo a esse tema será modificado, e o limite para o ciclo de alfabetização voltará a ser o 3º ano.

Por outro lado, o ministério insiste que ocorra ao longo do 1º e 2º ano o letramento, ou seja, a capacidade das crianças de identificar letras e ler frases curtas, por exemplo. A plena alfabetização, quando o aluno saberia, por exemplo, ler parágrafos maiores e diferenciar uma carta de um romance, ficaria para depois.

“O ciclo de alfabetização será mantido em três anos anos, garantindo que o letramento seja em dois. O Conselho fez essa proposta e achamos adequado”. Ela afirma que, nessa linha, o ministério manteve a decisão de fazer a avaliação nacional de alfabetização ao final do 2º ano, e não no 3º, como vem ocorrendo.

O objetivo, segundo Maria Helena, é que as escolas tenham um diagnóstico rápido do que ainda falta fazer no ano letivo seguinte.

Os dados da edição mais recente do exame, aplicada em 2014 a crianças do 3º ano, mostram que apenas 78% dos alunos têm aprendizagem considerada adequada em leitura. Em relação à escrita, o índice é ainda menor, de 66%.

O resultado preocupa, porque é determinante para o desempenho em todas as outras disciplinas ao longo da vida.

Para Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a decisão de fazer a avaliação no 2º ano vai fazer com que, na prática, os municípios forcem a alfabetização até essa serie.

FOCO INDIVIDUAL

Especialista no processo de aprendizagem de leitura e escrita, a psicopedagoga Edith Rubinstein diz que, mais importante do que a idade, é a escola acompanhar muito de perto o processo de alfabetização de cada aluno.

O desenvolvimento, diz ela, varia de acordo com o contexto familiar –a escolaridade dos pais, o contato com livros etc.

Para ela, não há diferença significativa entre a idade de sete ou oito anos. O importante, afirma, é não só garantir a motivação das crianças, mas também reforçar o desenvolvimento de habilidades mais específicas, o que muitas vezes não acontece atualmente, em sua avaliação.

“Antigamente, a criança era ensinada a ler de forma mecânica, para só depois se interessar pelo conteúdo –o que não era bom”, diz ela.

Com o tempo, essa sequência se inverteu, mas a mudança em alguns casos foi exagerada, afirma.

“Algumas práticas tradicionais, como o treino da escrita e exercícios, foram deixadas de lado, e muitos alunos têm problemas como deficiência na coordenação motora fina e dificuldade em diferenciar letras parecidas.”

PROCESSO

Diretora do Colégio Equipe, escola particular na região central de SP, Luciana Fevorini diz que o processo de letramento varia muito de criança para criança e tem idas e vindas.

No início da vida escolar, a ideia da escola é promover um primeiro contato com a escrita, de forma a despertar um interesse pelo tema. Ao final do 2º ano, a maioria já está praticamente alfabetizada, afirma.

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