►Apesar da falta de acesso aos dados, os poucos disponíveis mostram que o segmento não foi fortemente impactado pela crise e que a procura permaneceu em alta no país
A região Nordeste é responsável por 23% de participação no número de consórcios celebrados no Brasil, com 1.661.698 consorciados ativos. Os números são da Associação Brasileira de Administradora de Consórcios - Abac - e colocam a região como a terceira mais numerosa quando o assunto é esse tipo de operação financeira.
A grande procura, mesmo em tempos de estagnação financeira, é reflexo dos baixos custos e juros, segundo Carlos Alberto Lyra, sócio-diretor do Consórcio Lyscar, que define esse meio de consumo como uma maneira inteligente de tentar juntar os recursos para realizar um sonho. “A ideia é planejar, não gastar tanto e realizar um sonho a um custo mais baixo até do que com o financiamento”, afirma Carlos Alberto.
Por isso, segundo ele, o consórcio é mais indicado para pessoas que precisem de ajuda para fazer um planejamento financeiro. “Isso é importante, já que pesquisas, como a última do SPC, apontam que quase 60% da população não conseguem juntar dinheiro. Com o consórcio, você paga uma parcela pequena - em média, R$ 400 ou R$ 500, e no final vai ter um patrimônio, podendo resgatá-lo”, ressalta.
QUE CRISE?
A Lyscar Consórcios atua no segmento em Sergipe há quase 40 anos, o que já confirma a perenidade desse segmento. A empresa opera com a realização de consórcios de imóveis, veículos e serviços. “Os mais contratados são os imobiliários”, revela Carlos Alberto. Esse, porém, é um dos poucos dados disponibilizados, já que as administradoras não contabilizam as operações por cidade. “O Banco Central não separa”, diz Lyra.
Apesar da falta de acesso aos dados, os poucos disponíveis mostram que o segmento não foi fortemente impactado pela crise econômica do país. Dados da última pesquisa realizada e divulgada pela Abac mostram que a procura pelo consórcio permaneceu em alta no país no período de janeiro a julho de 2018. Todos os segmentos que compõem o Sistema de Consórcios registraram aumento nas vendas.
De janeiro a julho do ano passado, foram comercializadas 1,43 milhão de cotas de consórcio - o melhor resultado para o período desde 2014. Apenas em julho, ocorreu a entrada de 213,9 mil novos consorciados. Trata-se do segundo maior volume do ano. Já em 2019, até o mês de março, foram 13,3% de aumento no setor.
►Perfil dos consorciados
A Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios também realizou uma nova pesquisa para conhecer o perfil dos consorciados em 2018. De acordo com o levantamento, 46% possuem até 39 anos e 67% são homens. A pesquisa revelou que 54% dos consorciados possui 40 anos ou mais. Destes, 29% estão na faixa de 40 a 49 anos, e 25% na de 50 ou mais.
O destaque foram os consorciados com idade entre 30 a 39 anos, que cresceram na base e hoje representam 35%. Há um ano, eles representavam 27%. A menor participação foi daqueles que têm até 29 anos, com 11%.
A pesquisa mostrou ainda que o consórcio está ligeiramente mais masculino. Em 2017 eles representavam 65% e, em 2018, esse percentual subiu para 67%. O levantamento também constatou que a base familiar foi mantida, predominando os casados, com 65%. Também, 23% são solteiros e 12% responderam “outros”.
JUDICIALIZAÇÃO
Apesar de todas as vantagens, o advogado Walber Muniz Bezerra explica que é preciso ficar atento na hora de contratar uma carta de consórcio. “Em 8 de outubro de 2008 foi editada a Lei 11.795, conhecida como Lei dos Consórcios. O referido diploma jurídico atribui ao Banco Central a coordenação, supervisão, fiscalização e controle do sistema de consórcios. Assim, a primeira cautela é consultar o Banco Central acerca da existência da administradora do consórcio, de processos de fiscalização e de denúncias frente à administradora”, aconselha Walber Muniz.
Walber salienta, também, que o interessado consulte órgãos como o Procon e sites de proteção ao consumidor para se certificar da existência de reclamações. Vale lembrar que, com a crise financeira, muitas pessoas acabam não conseguindo manter o consórcio e optam pela desistência.
Nesses casos, segundo Walber, para os contratos fechados até 5 de fevereiro de 2009, antes da vigência da Lei de Consórcios, o Superior Tribunal de Justiça - STJ - decidiu que o consorciado desistente ou excluído do grupo por inadimplência deve ser reembolsado 30 dias após a data prevista para entrega do último bem.
“Para quem contratou consórcio depois de 5 de fevereiro de 2009, há decisão do STJ determinando a devolução imediata dos valores pagos, descontadas as taxas de administração, mas a questão não é pacífica”, esclarece o advogado. Além disso, caso se sinta lesado pela operação financeira, o consorciado deve comunicar ao Banco Central, que é o órgão de fiscalização. “Deve consultar um advogado para ver a viabilidade de ajuizar uma ação de rescisão contratual”, orienta Walber.
VEÍCULOS LEVES
Como nem só de imóveis vive o segmento de consórcios, as vendas de cartas para veículos leves cresceram 5,4% no ano passado, segundo a Abac, o que resultou na comercialização de 647 mil cotas. Com isso, foram comercializados créditos de R$ 26,95 bilhões, crescimento de 4,7%.
As contemplações e o volume de créditos disponibilizados tiveram expansão de 6,8%. Em valores absolutos, foram 327,8 mil contemplações e R$ 13,37 bilhões. Em julho, o número de participantes ativos nesse segmento fechou em R$ 3,59 milhões – alta de 4,4%. Já o tíquete médio, de R$ 42 mil, representou baixa de 2,8%.
O segmento das motocicletas continua em recuperação, com as vendas crescendo 14,4%. Foram comercializadas 561,75 mil cotas de janeiro a julho de 2018. No período, o volume de créditos comercializados teve alta de 12%, fechando em R$ 4,68 bilhões. As 289,5 mil contemplações e os R$ 3,1 bilhões de créditos caíram no mesmo patamar, de 12,7%. Em julho de 2018, o número de participantes ativos baixou 4,8%, ficando em 2,19 milhões. Já o tíquete médio, de R$ 8,4 mil, ficou 4,5% abaixo do atingido em julho de 2017.
VEÍCULOS PESADOS
O volume de créditos comercializados de janeiro a julho de 2018 cresceu 28,6%. Foram gerados negócios da ordem de R$ 5,53 bilhões, reflexo da venda de 36,6 mil cotas. Esse resultado da comercialização foi 26,4% superior ao atingido no mesmo período de 2017. O número de contemplações e o volume de créditos disponibilizados cresceram no mesmo patamar: 15%.
Foram 19,55 mil contemplados e disponibilizados créditos de R$ 2,76 bilhões. Em julho, o Sistema de Consórcios alcançou 293 mil consorciados ativos no segmento e um tíquete médio de R$ 152,1 mil. Comparando esses indicadores com o alcançado no mesmo mês de 2017, houve alta de 6,5% e estabilidade, respectivamente.
Em relação aos consórcios de serviços, o maior crescimento foi registrado em créditos comercializados, que teve alta de 58%. De janeiro a julho, foram gerados negócios da ordem de R$ 186,03 milhões. No mesmo período, foram vendidas 26,15 mil cotas, expansão de 52,9%. Já as contemplações, que beneficiaram 10,33 mil consorciados, foram 41,3% maiores.
CLASSE SOCIAL
Os dados revelaram que 73% dos participantes consultados são das classes C e D. A classe C é a maior, com 39%, seguida da D, com 34%, cuja renda familiar varia de 2 a 10 salários mínimos, respeitado o critério do IBGE.
Mas o destaque ficou com a classe B, que subiu de 12%, em 2017, para 20% em 2018. A classe A ficou com 7% e quase dobrou os 4% obtidos no levantamento anterior, voltando ao patamar de 2016.
Entre os consorciados, 32% são de automóveis, 21% de motocicletas, 15% de imóveis, 10% de serviços, 10% de eletroeletrônicos, 8% de caminhões e 4% de máquinas agrícolas, sendo a maioria com 12 meses ou mais tempo de participação no Sistema.
A ABAC realizada essa pesquisa, a cada dois anos, com o objetivo de atualizar perfil do consorciado e identificar as razões que os levaram a optar pelo consórcio para adquirir bens ou contratar serviços.
MERCADO
Por isso, ele chama a atenção para a necessidade de o Governo Federal implementar políticas públicas econômicas para fomentar o setor. “É de grande importância essa implementação”, garante. O presidente do Conselho Regional de Imóveis, o corretor, gestor imobiliário e administrador Sérgio Sobral, concorda com isso.
“Tem novo governo estadual, novo governo federal. Esperamos que o governo estadual invista em turismo. Em Alagoas, por exemplo, um dos fatores que fortaleceram o mercado imobiliário foi o investimento em turismo, atraindo negócios. Aqui em Sergipe, teremos ainda mais lançamentos”, afirma Sérgio Sobral.
Mas, para que isso ocorra, ele reconhece a importância das políticas públicas, especialmente as da concessão de crédito. “Nós da Diretoria do Sistema Cofeci-Creci tivemos duas reuniões este ano com a Caixa Econômica Federal, mostrando que é importante e necessário diminuir os juros, aumentar prazos de financiamento, abrir linhas de financiamento”, revela Sobral.
MENOS JUROS
Sobral acredita que o mercado imobiliário é um referencial. “Equivale a 19% do PIB brasileiro. Então quando este setor cresce, alavanca toda a economia. Quando está em queda, também tem impacto em todos os outros segmentos”, reforça.
E os consórcios, sem dúvida, ajudam a fortalecer o mercado. “No Brasil, o consórcio é uma modalidade que ainda está conquistando as pessoas, ainda está crescendo. E é uma das linhas com os juros mais baixos que tem, e é promissora, mas ainda é necessário um trabalho intenso de divulgação”, avalia Sérgio Sobral.
Na verdade, segundo a Caixa Seguradora, uma das entidades que realizam consórcios no país - em 2018, movimentou R$ 1,4 bilhão com imóveis e veículos - a principal vantagem dessa modalidade é que o cliente não paga juros, mas somente a taxa de administração, que é diluída no prazo contratado.
IMÓVEIS
“A estagnação econômica não influenciou o setor. Não houve queda significativa comparada a outros segmentos. Mas temos que trabalhar mais para continuar assim”, ressalta Carlos Alberto. E acrescenta: “Não temos dados do Estado. Mas aqui na empresa a procura maior é por imóveis e automóveis, especialmente motos, carros populares e da linha SUV”.
De fato, os negócios imobiliários ocupam o topo das transações, seguidos por veículos e serviços. O total de consorciados ativos em 2018 fechou em 870 mil, crescimento de 7,9% em relação ao obtido em julho de 2017. O tíquete médio no mês ficou estável, contabilizado em R$ 136,8 mil. No acumulado do ano até julho, o número de contemplações e o volume de créditos disponibilizados cresceram 2,2%.
Por aqui, apesar de não haver muitos dados disponíveis, o setor imobiliário é responsável por grande parte das contratações, o que pode ajudar na retomada do crescimento, tão esperada pela Associação dos Dirigentes das Empresas do Mercado Imobiliário de Sergipe - Ademi/SE.
“O mercado imobiliário, assim como todos os segmentos da economia, está em compasso de espera pelo encaminhamento das reformas estruturantes que nosso país tanto precisa. A tendência de crescimento continua forte, e a nossa expectativa é a de que políticas públicas, em especial para o setor, sejam implementadas o mais brevemente possível”, afirma o engenheiro civil Henrique Wagner Fonseca Côrtes, presidente da Ademi/SE.
RETOMADA
Quando fala nessas políticas públicas, Henrique Côrtes incluiu a concessão de crédito, que pode ser disponibilizada através das cartas de consórcios. “O crédito imobiliário é essencial para o mercado. Afinal, quanto mais crédito, mais negócios podem ser realizados”, justifica o presidente da instituição.
Para Henrique Côrtes, o setor já demonstrou que tem competência e disposição para empreender e, agora, precisa apenas de apoio institucional para que possa planejar e executar com segurança. “Não se pode negar que a crise econômico-financeira vivenciada nos últimos anos impactou a construção civil como um todo. O segmento imobiliário também sofreu com ela, com muitos distratos, crédito mais difícil ao mutuário e redução na velocidade de vendas, com consequência direta no acúmulo do número de unidades em estoque”, ressalta.
Como consequência, segundo Henrique, houve uma redução no número de lançamentos e uma menor oferta de empregos, o que só agravou a situação. “Assim, um ciclo negativo foi criado em toda a economia, mas acreditamos que este período está passando e que um novo ciclo de crescimento está por vir”, destaca o presidente da Ademi/SE.
COMPRA COLETIVA
Isso porque o consórcio funciona como uma modalidade de compra coletiva, onde um grupo de pessoas se compromete a pagar uma parcela mensal, por um tempo determinado. Esse dinheiro é guardado num fundo comum e, todo mês, alguns integrantes do grupo são escolhidos - por sorteio e lance - para receber o valor do crédito e comprar o bem.
Essas operações financeiras, segundo Sérgio, são importantes para a retomada do setor e, consequentemente, da categoria. “Sem financiamento, o mercado imobiliário reduz drasticamente. A base do mercado é formada por três pilares: construtoras, corretores e financiamento. Se um desses fatores não funcionar, o mercado não evolui. Já vi países nos quais o financiamento não é ágil e, consequentemente, o mercado imobiliário não se desenvolve como esperado”, reitera.
Segundo a assessoria da Caixa em Sergipe, a expectativa é de desempenho positivo na concessão de empréstimos para habitação até o final de 2019. O volume de financiamentos imobiliários aumentou em relação ao balanço anterior. Isso demonstra que o mercado imobiliário vem apresentando uma recuperação, o que pode ser um termômetro para demonstrar que o setor passa por crises, mas não deixa de produzir e gerar riquezas.
RECURSOS
De acordo com a assessoria, mesmo em um cenário de baixa atividade econômica, a Caixa concedeu mais crédito imobiliário à população em 2018 do que em 2017 - o aumento foi de 2,3% –, financiando mais de 554 mil unidades e encerrando o ano de 2018 com 68,8% de participação no mercado imobiliário.
De olho nesse mercado, o Banco do Estado de Sergipe – Banese – lança, até julho desse ano, uma linha de crédito na modalidade de consórcios, em parceria com a Embracon, administradora de Consórcios, responsável pelos grupos de consorciados e pelos créditos. Heráclito Coutinho de Oliveira, diretor Técnico da Banese Administradora e Corretora de Seguros, explica que o Banese resolveu lançar o consórcio para “oferecer aos seus clientes mais um produto financeiro”.
Produto que, segundo Heráclito, é um planejamento financeiro de médio/longo prazo. “Sem taxa de juros, para que os clientes possam realizar sonhos, como casa própria, veículos e serviços (viagens, cirurgias, formaturas)”, confirma.